Raimundo Passos, morador ilustre da cidade de Casa Nova, se destaca por estar sempre atualizado com os fatos locais e acontecimentos do passado. Nessa entrevista ele fala sobre a política na cidade, a transição da Casa Nova antiga para a atual e o impacto social sofrido pela população com a mudança; e comenta sobre a educação na região. Raimundo Passos tem 74 anos, foi eleito cinco vezes vereador, foi secretário e também vice-prefeito e ainda chegou a assumir a prefeitura por um mês na gestão de Zé da Totonha.
JCN - Raimundo Passos, como foi o início de sua trajetória política?
R.P. – Eu iniciei muito cedo a minha vida política. Quando era garoto, com meus quinze anos, não existia as facilidades que tem hoje, a exemplo do carro. Naquela época os eleitores eram procurados nas suas residências principalmente no interior e essa procura era feito montado em animais, não tinha carro, não tinha estrada, não tinha nada. Eu fazia trabalho de recenseador eleitoral, não como é hoje. Eu comecei nessa época, meu pai foi vereador por três legislaturas e depois o senhor Raul Santos, ex-prefeito daqui, um dos grandes nomes dessa terra me convidou e eu aceitei o convite dele para ser vereador. Fui eleito por cinco legislaturas, embora não tenha ocupado as cinco legislaturas, porque as vezes agente era deslocado para uma secretaria, de governo, de obra. Eu passei por quase todas essas secretarias. Fiz o possível como político, fiz o que pude. Hoje não me sinto mais em condições de fazer política, e o que acho que devo fazer é deixar essa vida política porque a idade não permite e eu não me conformo com a política que hoje está existindo. A política é uma empresa.
JCN - O senhor falou na história política de Casa Nova, que em relação aos senadores, deputados federais e estaduais que aqui já teve, e que hoje não temos nenhuma expressão política a nível estadual e nacional. Como foi esse tempo em Casa Nova?
R.P. - Naquele tempo existia uma união, a cidade era menor, nós não tínhamos o progresso, mas nós tínhamos aquilo que nada compra que era a união, a paz, a tranqüilidade e a harmonia. Assim nós podíamos fazer nossos representantes e hoje não tem essa união. Nós sempre tivemos representantes na Câmara Estadual, Câmara Federal e Senadores da Republica que foram dois, de uma só vez: Rui Santos e Luiz Vianna Filho. Dois estadistas de renome não só baiano, mas nacional e internacional, porque o Luiz Viana Filho chegou a ser Ministro da Casa Civil e ainda foi o responsável pela cassação de mandato de muita gente. Era o autor daquele projeto.
Então o que agente via também, deputado Antonio Honorato, filho da terra, grande deputado, foi presidente da Assembléia Legislativa da Bahia por duas vezes. Foi governador de estado por alguns dias, e pronto parou por ai. Casa Nova não pode dizer que tem representantes e pode, porque são ‘cento e tantos’ eleitores. Agora no passado nós tínhamos união, quando saía um candidato lá, nós sempre elegemos. Começamos com Raimundo Santos há muitos anos atrás, nosso primeiro representante, que também foi ex-prefeito em Casa Nova. A votação saía de 90% a 96%, ai é onde o povo dizia que era ‘cabresto’, ‘cabresto desgraçado’ é esse de agora, porque votam em quem não é da terra e em quem não tem nenhum compromisso com o povo daqui.
Agora mesmo nós tivemos um que era filho da terra que perdeu a eleição em Casa Nova. Então a cidade não quer nada com política, quer é com os aventureiros.
JCN O senhor participou da transferência das pessoas que vieram da Casa Nova Velha para a nova cidade? O senhor pode contar em um breve relato de como foi essa história da passagem de Casa Nova, tanto politicamente e fatos históricos?
R.P - Sim, eu acompanhei de perto, porque inclusive eu era secretario de governo. Porque naquela época aqui na Bahia não tinha vice-prefeito. Quem respondia como vice-prefeito era o secretario de governo, e eu fui por oito anos quando o Raul Santos era prefeito.
Foi na administração de Clodoaldo Castro, foi quando a cidade mudou pra aqui (local novo onde foi construída Casa Nova), eu participei dessa mudança como um todo, até a construção dessa cidade eu sei toda como foi. Mas essa transferência foi um verdadeiro sofrimento, o cara não queria se conformar em deixar sua terra, teve caso de suicídio, de várias pessoas que morreram de depressão. Os que foram deslocados para o projeto de Bom Jesus da Lapa voltaram porque não se acostumaram lá. Chegaram aqui se alojaram aí na borda do Lago e tão vivendo, sobrevivendo.
Agora tem uma grande diferença entre a Casa Nova antiga e a nova, aqui o progresso chegou, nós não tínhamos televisão. Mas esse progresso ficou muito caro, porque nós perdemos a tranqüilidade. Lá nós tínhamos tranqüilidade, deitávamos com a porta aberta, conhecíamos todo mundo, hoje nós não conhecemos ninguém. A cidade cresceu, desenvolveu muito e não é para comparar com a de lá. Mas perdemos a união e a tranqüilidade, que o dinheiro não compra.
JCN - Como era a educação na época em que a cidade dispunha de expressões políticas importantes:
R.P - O estudo era muito diferente, a escola era diferente. Lá a gente aprendia, era diferente, o grau de escolaridade era melhor. Naquela época não tinha oitava não, era até o quinto ano, quem tivesse o quinto ano lá podia se submeter a um vestibular, o conhecido exame de admissão. Tudo que se aprende hoje na oitava serie, agente aprendia tudo no quinto ano. Hoje você pergunta a um aluno de segundo grau sobre o feriado de sete de setembro e ele não sabe. Ta deficitário o ensino.
JCN - E os políticos daquela época, eles adquiriam o conhecimento para se tornarem estadistas aqui?
R.P Eles estudavam aqui até o quinto ano, depois eles se submetiam ao exame de admissão. Há histórias que não eram do meu tempo que falam que o Luiz Vianna Filho, quando estudava em Salvador ia de burro daqui para Salvador. Até meu avô me contava uma história, que quando numa dessas viagens o Luiz Vianna Filho parou para descansar e disse que ia ler o livro para a pessoa que estava com ele, e tem o nome dessa pessoa só que eu não lembro, ele falou uma passagem assim: “Tenha medo das grandes vantagens oferecidas pelos homens”. É uma realidade, quando tiver uma grande vantagem oferecida pelo homem corra dela.
E os políticos daquela época, eram políticos polidos, que tinham conhecimento. Há quarenta anos eu andei pela primeira vez em Salvador e estava escrito na rodoviária Armando Vianna de Castro, filho de Casa Nova e engenheiro do Derba lá em SSA. É uma grande diferença do político do passado para o político atual, em matéria de conhecimento e relacionamento.
JCN - Comparação:
"Hoje temos uma Casa Nova diferente, hoje nós temos de tudo, na outra nós não tínhamos. Eu já lhe disse que agente não tinha carro, não tinha médico, não tinha nada. Nós não conhecíamos televisão, rádio, nós não tínhamos nada. Agora já próximo da vinda de Casa Nova pra aqui, é que nós estávamos tendo alguma coisa. Televisão não pegava, a energia era a diesel, Casa Nova cresceu e desenvolveu, mas eu sou sincero eu sou saudosista e prefiro a Casa Nova velha em todos os sentidos". Finalizou Raimundo Passos.
Essa entrevista foi concedida ao repórter Andrei do Jornal Casa Nova, há 13 anos. O jornal não existe mais, mas o entrevistado, hoje, com 87 anos, continua Lúcido e em casa, cumprindo a quarentena provocada por um virus desgraçado que surgiu na China chamado de coronavirus, vírus esse, que tomou conta do mundo e vive atormentando diariamente as vidas do ser humano!