O Senado aprovou em sessão virtual na noite deste sábado (2), por unanimidade, o pacote de R$ 120 bilhões de socorro aos estados e municípios na crise do coronavírus, sendo R$ 60 bilhões de repasse direto para o caixa de governadores e prefeitos.
O socorro previsto aos entes federados será de quatro meses. Se após esse período estados e municípios ainda estiverem com as contas apertadas, não poderão usar a pandemia para tentar suspender o pagamento de dívidas que têm com a União.
Agora, o texto vai para apreciação da Câmara dos Deputados. Se houver mudanças, volta ao Senado. Só após passar pelas duas Casas a medida será encaminhada para sanção do presidente Jair Bolsonaro.
A nova versão do auxílio foi elaborada pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), relator da medida, com a ajuda da equipe econômica do governo. O texto final foi fechado apenas na tarde deste sábado, minutos antes da votação.
Segundo Alcolumbre, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) ficou descontente com o Senado, que ignorou o projeto aprovado na Casa. O presidente do Senado alegou que, depois de várias conversas, as divergências foram sanadas. A expectativa é que, após sanção, os municípios possam receber a primeira parcela dos valores ainda na segunda semana de maio.
“Eu falei com o presidente Maia, que acordou que, se votarmos o texto hoje, a Câmara vota o texto do Senado sem alterações na segunda-feira (4) e depois encaminha para sanção presidencial”, afirmou.
Uma das alterações foi feita com o aval do ministro da Economia, Paulo Guedes, garantindo aos servidores públicos que estão atuando diretamente no combate à pandemia não serem ser atingidos pelo congelamento de benefícios.
Pelo texto, são R$ 60 bilhões de repasses diretos. Desse total, R$ 10 bilhões irão para o combate ao coronavírus, nas ações de saúde – R$ 7 bilhões para estados e R$ 3 bilhões para as cidades (distribuídos de acordo com a população). O rateio dos R$ 7 bilhões entre estados será feito de acordo como a população do ente (com peso de 60%) e a taxa de incidência da Covid-19 (com peso de 40%). Com isso, segundo Alcolumbre, haverá estímulo para a realização de testes da doença.
Os R$ 50 bilhões restantes para uso livre, a fim de garantir o funcionamento da máquina com a perda de ICMS (estadual) e ISS (municipal), tiveram alteração na reta final antes da votação. Antes, previa-se que metade ficaria para estados e metade, municípios
Com a mudança, feita por meio de uma emenda do senador Eduardo Braga (MDB-AM), o rateio do bolo financeiro ficou em 60% para estados e 40% para os municípios. O valor dos repasses serão abatidos dos encargos da dívida pública de estados e municípios.
O projeto prevê ainda a suspensão dos pagamentos de dívidas de estados e municípios com a União neste ano e com bancos públicos, o que resultará em uma economia de R$ 49 bilhões. A proposta permitir ainda a renegociação com bancos privados e organismos internacionais, na ordem de R$ 10,6 bilhões.
A proposta garante também que os recursos sejam destinados mesmo para os estados e municípios que estejam inadimplentes ou que não tenham cumprido algum critério exigido pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), não importando a sua situação cadastral, financeira ou contábil.
Como contrapartida da ajuda financeira da União para estados e municípios durante a pandemia, seja feita uma alteração na LRF, a fim de que os gestores fiquem impedidos de criar despesas obrigatórias, como conceder reajustes ao funcionalismo público até o final de 2021. Com isso, o projeto estima uma economia entre R$ 121 bilhões e R$ 132 bilhões.
O relatório inicial deixava uma brecha para que a despesa com pessoal não fosse congelada se o gasto for necessário ao combate do novo coronavírus. Mas os senadores não sentiram segurança no texto, e encaminharam emendas pedindo a garantia.
Sob o receio de que pudessem dificultar a votação da proposta, o ministro da Economia telefonou aos senadores dando o aval para a mudança.
“É fundamental dar o apoio necessário aos profissionais de saúde e de assistência, garantindo, quando for o caso, suporte financeiro para o transporte, abrigo e proteção para que desempenhem a principal função durante a crise, que é preservar vida”, escreveu Alcolumbre, no relatório.
O texto aprovado permite que promoções e progressões para os ocupantes de cargos estruturados em carreiras sejam preservadas durante o período da pandemia. É o caso, por exemplo, dos militares federais e dos estados.
Com a anuência do próprio ministro, os senadores já davam boa parte das divergências com a proposta solucionada antes mesmo de o relatório estar finalizado.
“O Paulo Guedes mesmo me ligou dizendo que eu podia ficar tranquilo que essa garantia estaria no texto. Ele procurou outros senadores também. O pessoal que está escalado para a linha de frente na pandemia não pode ficar sem benefícios. Ele entendeu a nossa demanda e garantiu que vai acatar a mudança”, contou Major Olímpio (PSL-SP).
Na última hora, com receio de que houvesse uma mudança no texto na Câmara, Davi Alcolumbre ainda acatou outra alteração, que estende a mudança para as Forças Armadas.
“Vamos acatar a mudança para contemplar servidores civis e militares e, no hall das emendas, atender os integrantes das forças armadas também.”
Alcolumbre também aceitou a alteração que prevê a suspensão da parcela de débitos previdenciários dos últimos anos de 2019 dos entes que estão em dívida. Com isso, a União deixará de arrecadar R$ 5,6 bilhões, de acordo com o relator.
O possível aumento na ajuda financeira para estados e municípios também foi alvo das tentativas dos senadores de mudaram o projeto. Todas elas, contudo, foram rejeitadas.
“Infelizmente, as limitações orçamentárias da própria União impuseram esse teto de R$ 60 bilhões, até mais elevado do que os números inicialmente divulgados. Por esta razão, não podemos acolher as emendas”, disse o relator.
Em meados de abril, a proposta apresentada pela equipe econômica previa uma ajuda financeira de R$ 77,4 bilhões, com R$ 40 bilhões de transferência direta. A Câmara aprovou uma proposta que poderia passar R$ 200 bilhões, nos cálculos do governo, e que foi engavetada pelo Senado.
Com a queda da economia, a receita dos estados e municípios está caindo e alguns gestores dizem que logo ficarão sem recursos para pagar salários. Pressionado por governadores, os senadores tentaram ainda que o governo aceitasse uma nova fórmula para a divisão do dinheiro.
Antes da votação, o Comsefaz (Comitê Nacional de Secretários de Fazenda, Finanças, Receita ou Tributação dos Estados e do Distrito Federal), encaminhou uma carta ao relator criticando o projeto.
Segundo a entidade, a proposta do Senado destina aos entes federados 40% a menos que o previsto no projeto original da Câmara dos Deputados. Já os municípios, isoladamente, terão um acréscimo de 1% nos mesmos repasses, nessas dadas condições, por conta da mudança nos critérios de distribuição.
“Os estados foram duplamente prejudicados nessa primeira versão da proposta do Senado. Primeiro, no volume de recursos, menor do que a perda de receitas, que era atendida pelo texto da Câmara; e, segundo, quanto à proporcionalidade da divisão, que prevê 50% para cada ente, quando deveria ser de 70% para os estados e 30% para os municípios, considerando a participação das receitas de ICMS e ISS em 2019”, afirmou o presidente do Comsefaz, Rafael Fonteles.
Em nota, a FNP (Frente Nacional dos Prefeitos) afirmou que a fórmula do governo desequilibra as finanças.
“A alteração da proposta de partilha dos recursos federais para municípios e estados, apresentada pelo Senado Federal torna mais desequilibrada a compensação de frustração de receitas dos entes subnacionais, decorrente da pandemia do novo coronavírus.”
Para o pagamento da ajuda financeira, a União exige ainda que os entes federados retirem de ações judiciais com pedido de suspensão de pagamento de parcelas de dívidas com a União. Pelo texto, só após isso o dinheiro será liberado.
Segundo estimativas da equipe de Guedes, somente no STF (Supremo Tribunal Federal) os processos em andamento têm impacto de R$ 50 bilhões aos cofres do Tesouro Nacional. O projeto do Senado impede que estados e municípios ingressem com as ações após o período da pandemia. Nesse período, a União deixará de depositar a ajuda financeira extra prevista.
Folha/Foto: Rodrigues/Agência Senado