Buchada e dobradinha chegarão pré-prontas aos supermercados das regiões Nordeste e Sudeste

Buchada e dobradinha

Pesquisadores da Embrapa e da Universidade Estadual Vale do Acaraú (UVA) desenvolveram um método para padronizar o preparo de buchada e dobradinha, pratos derivados de carne ovina típicos da Região Nordeste, garantindo o controle higiênico-sanitário dos produtos e aumentando do seu tempo de conservação.  

A equipe chegou a uma formulação de preparo que possibilita a disponibilização desses alimentos pré-prontos nos mercados do Nordeste e Sudeste, onde identificaram existir uma demanda maior de consumidores.

A metodologia está disponível em um comunicado técnico e será repassada a profissionais de abatedouros, frigoríficos e agroindústrias a partir de capacitações ao longo deste ano.

De acordo com a pesquisadora da Embrapa Caprinos e Ovinos (Ceará) Lisiane Dorneles, o aproveitamento das vísceras e órgãos dos ovinos agrega valor ao negócio e ajuda a reduzir o desperdício de matéria-prima, uma vez que o foco dos produtores é a carcaça (o animal abatido sem sangue, vísceras, órgãos internos e cabeça). “Na maioria das vezes esse material é tratado como resíduo industrial, sem valor comercial e causa problemas ambientais”, explica. 

Buchada e dobradinha são pratos bastante apreciados na Região Nordeste e também no Sudeste, onde chefs de cozinha as utilizam como pratos exóticos. “No entanto, mesmo entre os nordestinos mais jovens o consumo tem diminuído em função do preparo ser muito trabalhoso”, afirma Dorneles.

“Diante disso, faz-se necessário incentivar o consumo e o desenvolvimento de produtos elaborados com vísceras, a partir de técnicas que facilitem o preparo, bem como a oferta de porções que sejam condizentes com as necessidades dos consumidores e que ofereçam garantia da qualidade higiênico-sanitária”, conclui a pesquisadora.

A funcionária pública Francisca Maria Pitombeira, acostumada a preparar as duas receitas, confirma que são simples, mas dão um certo trabalho e a maior dificuldade é fazer a limpeza das vísceras. “Essa etapa é fundamental para uma buchada e uma panelada de qualidade. Ela deve ser muito bem feita com a retirada total da gordura. Depois adicionando um bom tempero tradicional com sal, colorau, alho, cebola pimenta do reino e cebolinha e boa dosagem de amor fica perfeito”, ensina. 

Para a engenheira de alimentos e professora da UVA Ana Sancha Malveira, a carne ovina, apesar de muito nutritiva e saborosa, ainda é desperdiçada. “Quando o brasileiro perceber o ouro que é essa carne, ele vai dar um salto de qualidade de vida muito grande”, acredita. Como nordestina e consumidora desses pratos tradicionais desde a infância, Malveira afirma que os resultados alcançados pelo projeto podem colocar a carne ovina no patamar que ela merece e mostrar seu valor às outras regiões do País.

Outro problema identificado é que a falta de padronização no processo de produção, particularmente na etapa de limpeza, gera insegurança nos consumidores devido à presença de elevada carga microbiana nas vísceras. A equipe do projeto fez avaliações em relação ao tempo, temperatura e adição de produtos na limpeza das vísceras brancas (estômago e intestinos) e as vísceras vermelhas foram tratadas de forma diferente, de acordo com a necessidade de cada parte. Tudo para garantir a qualidade sanitária sem perder os requisitos de sabor, aroma e aparência na avaliação sensorial dos pratos e oferecer alimentos mais seguros para os consumidores. 

A buchada e a dobradinha são pratos elaborados de forma artesanal, o que aumenta as possibilidades de contaminação microbiana. Por isso, atenção especial foi dada ao desenvolvimento de técnicas que tornem esses alimentos mais seguros para o consumidor final.

A zootecnista Jaine de Sousa Santos, que faz parte da equipe do projeto, explica que os resultados das pesquisas mostraram que as vísceras submetidas ao processo de limpeza, utilizando água fervente com ácido acético apresentaram redução do número de coliformes totais e termotolerantes, além de redução da presença de Staphylococcus aureus (perigosa bactéria causadora de diversas infeções em seres humanos) quando comparadas com as vísceras que não receberam nenhum tipo de tratamento.

“A contagem desses microrganismos é um indicador da eficiência da limpeza nas etapas de fabricação, da temperatura de conservação e da vida útil dos alimentos”, afirma.

A equipe de pesquisa utilizou ácido acético e água aquecida nos procedimentos de limpeza da matéria-prima, em temperaturas que variavam entre 55°C e 90°C.  Os resultados mais satisfatórios ocorreram com a temperatura de 65°C aplicada nos estômagos (para produção da buchada) e 80°C utilizada nos intestinos (para a confecção da dobradinha).

As más condições de higiene nos processos de abate, principalmente na etapa de evisceração, facilitam a disseminação de micro-organismos causadores de doenças e aumentam as perdas econômicas decorrentes da contaminação das vísceras e por reduzir ainda mais o tempo de prateleira dos produtos. Daí a importância de oferecer capacitação, inclusive sobre boas práticas de fabricação, para os trabalhadores dos frigoríficos e abatedouros. 

A pesquisadora da Embrapa Pecuária Sul Élen Nalério explica que apesar de não existir o hábito de consumo desses pratos na Região Sul do Brasil, os frigoríficos que abatem ovinos têm interesse nas capacitações porque podem agregar valor às vísceras, produzindo buchada e dobradinha para vender aos mercados do Sudeste. “Identificamos na Região Sudeste um público consumidor potencial caso os produtos estejam disponíveis em estabelecimentos inspecionados, como supermercados”, explica a pesquisadora.  

GASTRONOMIA: A buchada é típica da culinária nordestina, mas a dobradinha vem conquistando cada vez mais espaço na gastronomia das regiões Sudeste, Centro-Oeste e Sul (onde é chamada de mondongo). Ambos os pratos são feitos à base de vísceras brancas (intestinos e estômagos) e vermelhas (coração, fígado, pulmões e rins). Na buchada, utilizam-se mais as vísceras vermelhas, que são picadas e cozidas em “sacos”, conhecidos como buchos, feitos com o estômago do animal. A dobradinha é feita com maior quantidade de vísceras brancas picadas e cozidas normalmente.

Os órgãos e vísceras de ovinos são uma importante fonte de proteína animal, com valor proteico de 21,92%. Os dois produtos apresentam um valor alto, o que os credencia como importante fonte de proteína na dieta humana. A gordura determinada na buchada e na dobradinha apresentou valores de 2,62% e 2,32%, respectivamente. “É importante ressaltar que o baixo teor de gordura determinado nos produtos está relacionado diretamente ao processo de produção, que além de retirar o excesso de gordura no procedimento de limpeza, dilui também parte da gordura no processo de cocção do caldo”, enfatiza Dorneles. 

Ascom Embrapa


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