Crônica: A paineira que dava jaca


thumbnail foto Rodrigo Alves de Carvalho

Etelvino sempre morou na mesma casa, ou melhor, casarão que fora de seus avós, seus pais e agora era sua herança. Havia um grande quintal onde um pomar era muito bem cuidado desde os tempos de seu avô. 

O que se destacava no pomar não eram as variadas espécies de árvores frutíferas e sim a grande e imponente paineira de mais de 200 anos. 

Etelvino estava noivo de Verônica há mais de cinco anos, porém o casório nunca saia. Verônica queria casar com Etelvino, mas nem por decreto presidencial aceitava morar no casarão. 

- Casa velha deixa a gente velha! Quero uma casa mais moderna no centro da cidade! 

Por isso Etelvino relutava em casar. Amava Verônica, mas como o único bem que possuía era o casarão, teria que vendê-lo para comprar uma casa nova no centro e essa ideia não passava por sua cabeça, pois adorava o casarão que trazia tantas lembranças boas. 

Com isso, o tempo ia passando, sem a venda da casa e sem o casório. 

Foi Duarte que viu a primeira vez: 

- Etelvino! O que é aquele negócio preso na paineira? 

Etelvino olhou o negócio, olhou para o Duarte que sempre pedia limão para fazer caipirinhas. 

- Está parecendo uma fruta! 

Com o passar dos dias a fruta foi crescendo e outras frutas começaram a brotar nos frondosos galhos da paineira. 

- É jaca! 

Gritou Duarte num outro dia quando derrubou a fruta com um bambu. 

- Como foi dar jaca numa paineira? 

A curiosidade de Etelvino logo se transformou na curiosidade da cidade inteira.  

Em pouco tempo muitos curiosos se aglomeravam debaixo da paineira, sobre as raízes. 

- Isso deve ser coisa da evolução das espécies! 

Dizia um metido à cientista só porque leu alguma coisa de Darwin. 

- Está parecendo um caso de dupla personalidade da paineira que pensa ser uma jaqueira! 

Dizia um metido a botânico com especialidade em psicanálise. 

Alguns especialistas tentaram resolver o mistério que afligia a paineira e sua produção de jacas. Contudo, nenhuma conclusão foi concluída. 

Com a popularidade, Etelvino passou a ser uma pessoa bem vista pela sociedade local e seu casarão acabou se tornando um ponto turístico na cidade. Todos queriam conhecer a paineira que dava jaca. 

Verônica que outrora queria se livrar do casarão, agora não arredava o pé do local. Aproveitou a fama do noivo e pegou carona, aceitando o casamento e viver o resto da vida no casarão abençoado. 

A lua de mel e os primeiros meses de casados foram regados a muita felicidade e doce de jaca... 

Coisa que acabou numa manhã de sábado quando Verônica pegou suas coisas e foi embora do casarão. 

Etelvino desesperado quis saber o porquê e ela jogou a página de um jornal da cidade vizinha com a manchete: 

“Inacreditável! Uma seringueira também começa a dar jaca. E não é só isso, ao invés de látex ela dá vinho tinto doce”. 

Etelvino amassou o jornal e lamentou sua sorte: 

- Pô paineira! Você bem que poderia dar pelo menos uma cachacinha também!  

Rodrigo Alves de Carvalho nasceu em Jacutinga (MG). Jornalista, escritor e poeta possui diversos prêmios literários em vários estados e participação em importantes coletâneas de poesia, contos e crônicas. Em 2018 lançou seu primeiro livro individual intitulado “Contos Colhidos” pela editora Clube de Autores. 


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