Weintraub era visto como gentil e culto por amigos do mercado financeiro

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Dono de uma retórica inflamada contra opositores do governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), o agora ex-ministro da Educação Abraham Weintraub é tido por amigos e ex-colegas do setor financeiro como cortês, educado e culto.

Bolsonaro anunciou a demissão nesta quinta-feira (18). A saída ocorre em decorrência de um longo desgaste político do Weintraub com os ministros do STF (Supremo Tribunal Federal).

Por ter diploma de economista e ter feito carreira no mercado financeiro, ele foi indicado pelo governo brasileiro ao posto de diretor-executivo do Banco Mundial para um grupo de países acionistas do qual o Brasil faz parte junto com Colômbia, Equador, Filipinas, Haiti, Panamá, República Dominicana, Suriname e Trinidad e Tobago.

O salário anual previsto para o cargo é de US$ 258.570, o equivalente a R$ 115,8 mil mensais sem 13 º -cerca de R$ 1,3 milhão por ano. O valor é mais de três vezes o salário de ministro, de R$ 31 mil.

O Banco Mundial, com sede em Washington, é uma instituição afeta à exposição pública e polêmicas de qualquer espécie, ainda mais nas redes sociais, onde Weintraub se mostrou muito ativo. O Brasil já foi representado no organismo por Pedro Malan, Murilo Portugal e Otaviano Canuto, conhecidos pela discrição e diplomacia no trato privado e social.

Questionado sobre o novo posto de Weintraub, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) ironizou a nomeação.

“Porque não sabem [no Banco Mundial] que ele [Weintraub] trabalhou no Banco Votorantim, que quebrou em 2009, e ele era um dos economistas do banco”.

Segundo o advogado criminalista Fernando Castelo Branco, professor da PUC-SP, a nomeação de Weintraub e a sua consequente mudança para Washington pode atrasar o andamento dos inquéritos em que ele é investigado.

Weintraub é alvo do inquérito das fake news, que tramita no Supremo, e também de uma investigação no tribunal por racismo por ter publicado um comentário sobre a China.

Weintraub chegou a defender a prisão de ministros do Supremo, a quem chamou de vagabundos em reunião ministerial gravada em 22 de abril. O vídeo se tornou público por fazer parte do inquérito que apura denúncias do ex-ministro da Justiça Sergio Moro de que Bolsonaro tentava interferir na Polícia Federal.

“A investigação por racismo deve passar à Justiça Federal comum. Por não ter restrição de saída do país imposta pela Justiça, ele pode assumir o novo posto, mas precisa comparecer em juízo quando solicitado. A mudança para o exterior torna o avanço do processo mais lento”, diz.

Economista formado pela USP, Weintraub fez carreira no Banco Vototantim (hoje BV). Ele ingressou como estagiário no grupo em 1994, mesmo ano em que se graduou, e permaneceu na companhia por quase 18 anos, até 2012.

No grupo Votorantim, chegou a ser economista-chefe do banco e diretor-executivo da Votorantim Corretora no Brasil e da Votorantim Securities no Estados Unidos e na Inglaterra.

Em seu currículo, Weintraub afirma ter sido diretor da corretora de março de 2004 até sua saída, em maio de 2012.

Segundo ex-colegas e amigos, Weintraub foi homem de confiança de então presidente do banco Wilson Masao, que o nomeou como diretor da corretora.

Masao, hoje sócio da F2 Investimentos, passou mais de 30 anos no grupo Votorantim. Ele foi diretor financeiro do conglomerado e esteve à frente da gestão do banco entre 1993 e setembro de 2011, quando foi substituído, em meio a uma crise, pelo executivo João Roberto Teixeira.

Ao assumir, Teixeira precisou fazer o que um advogado que assessorou o banco em operações financeiras classifica como faxina na gestão da instituição, e substituiu toda a diretoria paulatinamente. O Banco Votorantim chegou a encerrar 2011 com prejuízo de R$ 201 milhões. O resultado foi influenciado à época pela alta na inadimplência de financiamentos de veículos novos.

Foi nesse cenário que Weintraub deixou o banco, em maio de 2012. Segundo advogados que atenderam o banco na época, o ex-ministro era tido comok um profissional bem relacionado que lidava pouco com o dia a dia operativo da instituição.

Amigos e ex-colegas que conviveram com o ex-ministro no banco afirmam que, embora ele sempre tenha sido reconhecidamente conservador, não tinha fama de polemicista. Weintraub é tido como o idealizador das corretoras da Votorantim em Nova York e Londres e sua gestão é elogiada e tida como exemplar.

A atual imagem do ministro, que era tido como expoente da ala mais radical do governo, é novidade para um amigo do setor financeiro. O personagem do ministro, diz, não corresponde à pessoa, que costumava estabelecer relações cordias por onde passava.

Durante sua passagem pelo MEC, Weintraub foi criticado pelas recorrentes faltas ortográficas e gafes. No mercado financeiro, no entanto, ele era reconhecido por ser um profissional culto, segundo um colega que trabalhou na empresa com o ex-ministro por mais de dez anos.

Entre as gafes do ex-ministro, está a cometida em audiência no Senado em junho do ano passado, quando Weintraub confundiu o sobrenome do escritor Franz Kafka com o prato de árabe kafta.

Em outro episódio, em janeiro deste ano, então ministro chegou a grafar “imprecionante” em vez de impressionante em um tuíte que dizia ao deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) que não havia no MEC uma área de pesquisa sobre segurança pública antes de sua gestão.

Após sair do Votorantim, Weintraub foi sócio enttre 2013 e 2014 da gestora Quest Investimentos (hoje AZ Quest), fundada pelo ex-ministro das Comunicações e ex-presidente do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) Luiz Carlos Mendonça de Barros.

Procurado pela reportagem, Mendonça de Barros diz não ter tido contato com Weintraub, que era, segundo ele, “muito júnior no departamento econômico” da gestora.

Pouco antes de sair da Quest, Weintraub assumiu o cargo de professor do curto de Ciências Contábeis do campus da Unfesp (Universidade Federal de São Paulo) em Osasco, do qual está licenciado.

Folha de S.Paulo/Foto: Marcos Corrêa/PR


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