O senador José Serra (PSDB-SP), que foi ministro da Saúde do governo Fernando Henrique Cardoso de 1998 a 2002, considera que o presidente Jair Bolsonaro está sendo irresponsável na condução da crise do novo coronavírus.
Ele defende Luiz Henrique Mandetta (Saúde). “Ele está na linha correta, fazendo o que qualquer ministro da Saúde faria. O Bolsonaro precisa deixá-lo trabalhar”, afirmou o senador.
“É um comportamento inusitado para um homem púbico, quem dirá um chefe de Estado, o do presidente”, disse por telefone Serra, que está isolado com a família numa praia nordestina e participando de debates no Senado por via remota.
O tucano tem 78 anos, e a Casa dispensou todos os parlamentares pertencentes a grupo de risco.
Mandetta está em rota de colisão com o seu chefe desde que a crise começou. O ministro aposta nas recomendações por isolamento social nessa fase da expansão do vírus pelo país, conforme indica a OMS (Organização Mundial da Saúde).
A maioria dos governadores de estado vai na mesma linha, a começar por João Doria (PSDB-SP), adversário político de Bolsonaro, o que acirrou a discussão sobre o tema. O senador tucano não quis comentar o desempenho dos chefes estaduais na crise detalhadamente. “No atacado, parecem estar trabalhando bem.”
Há semanas, o presidente notabiliza-se por chamar a Covid-19 de “gripezinha” e vai a aglomerações nas ruas para incentivar o que chama de volta ao trabalho. “É irresponsabilidade”, avalia Serra, comentando a visita de Bolsonaro ao comércio popular perto de Brasília no domingo (29).
A posição de Mandetta tem defensores no governo, como o ministro Sergio Moro (Justiça), e a cisão tem tornado o futuro da condução da crise mais nebuloso.
Economista e ex-ministro do Planejamento (1995-96, sob FHC), Serra não minimiza o impacto da pandemia na atividade econômica. “Nessa crise, tempo é dinheiro”, diz, receitando a emissão de dívida do governo para sustentar as medidas na área de saúde de forma continuada.
“Tenhamos claro que o governo terá de se financiar no mercado para bancar as ações de combate à Covid-19”, diz.
Ele preferiu não avaliar as medidas até aqui divulgadas pela área econômica do governo, por não ter tido tempo de estudá-las a fundo. Para ele, não falta dinheiro no Brasil para aplicar contra a crise de forma imediata, e sim coordenação no governo federal. “Recurso tem”, diz.
Serra considera que não há amarras institucionais para que “o Executivo tome as rédeas” do processo. Citou a decisão do Supremo Tribunal Federal flexibilizando temporariamente os limites de gastos dentro dos parâmetros da Lei de Responsabilidade Fiscal e a aprovação, pelo Congresso, do decreto de estado de calamidade –que ele mesmo havia proposto antes de o governo enviar o dele.
Isso permite o manejo livre de verbas do SUS (Sistema Único de Saúde), que o senador vê como central para o sucesso da tática de enfrentamento à pandemia com o reforço no número de leitos de terapia intensiva e na assistência básica de saúde.
Serra também apresentou outros cinco projetos relacionados ao coronavírus. O principal pede a criação de um fundo emergencial para centralizar todas as verbas do combate à crise.
Outros versam sobre o prolongamento do recebimento do seguro-desemprego aos afetados pela pandemia, mais verba para Santas Casas, ações de segurança pública durante quarentenas e a agilização da tramitação de matérias no Senado.
Quando assumiu a Saúde, Serra lidou com a explosão da epidemia de dengue no país. Ele diz não ver como comparar aquela realidade com a atual. “É muito mais grave agora”, diz.
Folhapress