A equipe do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), avalia que uma eventual decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) contra as emendas de relator ainda neste ano poderá atrapalhar a construção de apoio político do petista no Congresso Nacional.
Aliados de Lula com trânsito no Supremo afirmam que houve uma mudança na tendência do julgamento da ação que questiona o uso dessas emendas —recursos que são distribuídos por critérios políticos e que permitem aos congressistas mais influentes bancarem projetos e obras em seus redutos eleitorais.
A expectativa inicial era que o STF analisaria o caso em novembro.
Como mostrou a Folha, membros do PT e articuladores no Congresso passaram a admitir a continuidade das emendas de relator no Orçamento, mas com mudanças nas regras. Durante a campanha, Lula fez críticas ao uso das emendas de relator e defendeu o fim delas, citando entre outros pontos a falta de transparência do mecanismo.
“O Orçamento é chamado de secreto porque o destino desses recursos é mantido em segredo. Mas todo mundo sabe para onde esse dinheiro vai: fraudes e desvios de verbas”, disse um dos programas de TV do petista.
Agora eleito, Lula mudou o tom do discurso contra as emendas de relator e tem feito acenos à cúpula do Congresso, que controla a destinação desses recursos.
Em setembro, em meio à campanha eleitoral, a expectativa de que o Supremo poderia colocar um fim nessas emendas chegou aos principais articuladores do Legislativo e a membros do alto escalão do governo Jair Bolsonaro (PL). A avaliação era que, em caso de vitória de Lula, aumentariam as chances de o STF declarar o mecanismo inconstitucional.
O cenário mudou. Aliados de Lula e integrantes de partidos não alinhados ao petista dizem haver uma avaliação consensual no meio político de que o STF irá postergar o julgamento da ação contra as emendas de relator enquanto o novo governo e o Congresso tentam buscar uma saída política para o tema.
Auxiliares de Lula já falam na possibilidade de essas emendas passarem por ajustes, mas não serem extintas.
Parlamentares próximos a Lula sinalizaram à cúpula da Câmara e do Senado, por exemplo, que pode haver uma coordenação entre Executivo e Legislativo para priorizar programas nas áreas de habitação e saúde que podem atender a demandas das bases eleitorais dos parlamentares.
As emendas de relator somam R$ 16,5 bilhões no Orçamento deste ano. Elas foram a principal ferramenta para garantir apoio político para o presidente Bolsonaro no Legislativo e para fortalecer os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
Os chefes das duas casas legislativas têm poder sobre a liberação dessa verba, uma vez que a distribuição dos recursos depende de acordos costurados entre eles.
Lula esteve em Brasília nesta semana e fez acenos a Lira, que se aliou a Bolsonaro quando o governo atual passou a liberar emendas e cargos a partidos políticos. Lira tenta se reeleger ao comando da Câmara e promete uma postura independente —e não de oposição— a Lula.
Aliados de Lira reconhecem que, sem as emendas, o presidente da Câmara ficaria enfraquecido para a campanha à reeleição para o cargo. Mas entre petistas cresce a avaliação de que em qualquer cenário Lira é um adversário competitivo e que não vale a pena correr o risco de iniciar o novo governo com o presidente da Câmara como inimigo.
As ações no STF que pedem o fim das emendas são relatadas pela presidente do tribunal, ministra Rosa Weber. Em 2021, ela chegou a determinar a suspensão do uso dessa verba.
Rosa recuou da decisão um mês depois, após o Congresso apresentar uma série de medidas para dar mais transparência às emendas.
Em setembro, Rosa sinalizou que deveria levar o caso à análise do Supremo logo após as eleições. No entanto, a avaliação de petistas é que esse cenário mudou com a costura de acordos políticos entre a equipe de Lula e o Congresso.
O presidente Lula teve um encontro com dez dos 11 ministros do Supremo na quarta (9). O ministro Luís Roberto Barroso foi o único que não esteve presente, por estar participando da reunião global do clima da ONU —a COP27— no Egito.
Na campanha, Lula falou que a emenda de relator era a “maior bandidagem já feita em 200 anos de República [da Independência]” e que o Parlamento nunca “esteve tão deformado como está agora” —chamou inclusive de pior Congresso da história do Brasil.
Antes da eleição, Lula também disse que há um excesso de poder nas mãos de Lira.
Thiago Resende e Julia Chaib / Folha de São Paulo