De acordo com a PGR, Sérgio Moro cometeu crime de calúnia, previsto no artigo 138 do Código Penal/Foto: Divulgação
Advogados ouvidos pela Fórum avaliam que a denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) contra Sergio Moro (UB-PR) é “grave” e acreditam na condenação do ex-juiz, que em última instância pode vir a perder seu mandato e até mesmo ser preso. Nesta segunda-feira (17), a PGR denunciou Moro ao Supremo Tribunal Federal (STF), pedindo sua condenação e eventual prisão e cassação do ex-juiz da Lava Jato pelo vídeo em que ele aparece acusando o ministro Gilmar Mendes de “vender habeas corpus”.
Na peça jurídica encaminhada ao STF, a vice-procuradora-geral da República, Lindôra Araújo, sustenta que Moro “sabia perfeitamente da gravidade do que falava e fez isso publicamente”, sendo gravado e rodeado de pessoas, para que o fato fosse amplamente divulgado. O documento destaca, ainda, que o senador cometeu o crime de calúnia contra o magistrado do Supremo e que, se for condenado a uma pena de mais de quatro anos de prisão, o ex-juiz deve perder o mandato que tem no Senado.
À Fórum, o advogado Renato Ribeiro de Almeida, professor de direito eleitoral e coordenador acadêmico da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), afirmou que “a situação é bastante grave por que faz reflexão sobre os limites da imunidade parlamentar”.
“Os fatos são claramente caluniosos contra um ministro do STF e, independentemente do hoje senador concordar ou discordar das decisões proferidas por esse ministro do Supremo, há o dever de ser respeitar as autoridades judiciais e, mais do que isso, não atribuir a ninguém fato calunioso proveniente de crime sem que se tenha provas sobre esses fatos”, pontua Almeida.
“Evidentemente não há prova alguma que o ministro Gilmar Mendes proceda à venda de habeas corpus, de modo que tem razão a PGR em dizer que o senador da República, sabendo que está sendo filmado, sabendo da responsabilidade que tem, ainda mais como um ex-magistrado, alguém que esteve muitos anos no exercício da magistratura federal, o tipo de situação de gravidade que uma declaração dessa pode gerar à honra, à imagem pública de um agente público do Poder Judiciário”, prossegue o advogado.
O jurista destaca que, ao afirmar que um ministro do STF cometeria um crime em sua atuação jurisdicional, sem apresentar provas, Moro incorre em “uma ofensa da mais alta categoria” e, por isso, concorda com a posição da PGR em pedir penas rigorosas que incluem a perda do mandato de senador e reparação ao ministro Gilmar Mendes. Renato Ribeiro de Almeida ainda vai além e diz que a declaração de Moro sobre o ministro do STF configura quebra de decoro parlamentar, o que deve ensejar representação no Conselho de Ética do Senado pela cassação do ex-juiz.
“Se alguém, ainda que seja com palavras, comete um crime e esse alguém é um parlamentar, rigorosamente é um imperativo que os seus pares tomem as medidas no limite da sua cassação. Então, imagino que o senador deva ser também objeto de uma representação no Conselho de Ética do Senado pedindo sua cassação por quebra de decoro parlamentar porque evidentemente caluniar um ministro do STF, dizer que este vende sentenças, não é algo que se espera, o decoro que se espera de um senador da República, um cargo da mais alta relevância no nosso país”, explica.
“Chegou ao Supremo, mas não na condição que gostaria”
O advogado Marco Aurélio Carvalho, coordenador do Grupo Prerrogativas, disse à Fórum, por sua vez, que “Moro está provando do seu próprio veneno”.
“Ele acha que a atividade parlamentar dá todo e qualquer tipo de imunidade, e não é assim em um Estado de Direito. Tem uma liturgia que ele precisa respeitar, mas parece desconhecer. Ele foi muito irresponsável. Um senador da República que não tem hoje a blindagem que o judiciário dava quando ele estava na 13ª Vara Federal e que tem que ter responsabilidade sobre o que fala. Ele acusou de forma vil, leviana e criminosa um ministro da mais alta Corte constitucional do país. Tem que responder por isso, portanto”, considera.
O jurista ainda ironizou o fato de Moro sempre ter almejado uma vaga de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e, agora, ser alvo de uma denúncia da PGR à Corte.
“A ‘Terra plana’ não gira, capota. E capotou para ele. O Moro sempre sonhou em ir para o Supremo. Chegou a hora dele, não na condição que ele gostaria, mas na condição de réu que ele deveria estar há bastante tempo”, dispara Carvalho.
“Coisa grave”
Advogado, professor e ex-procurador de Justiça, o jurista Lenio Luiz Streck também falou à Fórum sobre a denúncia da PGR contra Moro. Em sua opinião, “há boas chances” do senador ser condenado neste caso.
“Sim, há boas chances [de Moro ser condenado]. Não sei se a pena chegaria a 4 anos. Mas caluniar ou difamar um ministro do Supremo é coisa grave. Principalmente se foi o Moro quem deixou espalhar o vídeo”, declara.
No pedido de prisão contra o senador Sergio Moro (União Brasil-PR) por calúnia, a Procuradoria-Geral da República (PGR) apresentou disse que o parlamentar “emitiu a declaração em público, na presença de várias pessoas, com o conhecimento de que estava sendo gravado por terceiro, o que facilitou a divulgação da afirmação caluniosa, que tomou-se pública em 14 de abril de 2023, ganhando ampla repercussão na imprensa nacional e nas redes sociais da rede mundial de computadores”.
“Comprovadas a materialidade e a autoria em suporte probatório consistente, à míngua de causas excludentes da tipicidade, da antijurídicidade e da culpabilidade ou extintiva da punibilidade, o denunciado Sergio Fernando Moro incorreu na prática do crime de calúnia (artigo 138, caput ele artigo 141, incisos II, III e IV e§ 2º, todos do Código Penal)”.
A Corte fez referência ao vídeo em que o ex-juiz suspeito aparece dizendo a interlocutores sobre “comprar um habeas corpus de Gilmar Mendes”. Segundo Moro, a frase foi tirada de contexto.
Na denúncia contra o senador, a PGR afirmou que, “ao atribuir falsamente a prática do crime de corrupção passiva ao Ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Ferreira Mendes, o denunciando Sergio Fernando Moro agiu com a nítida intenção de macular a imagem e a honra objetiva do ofendido, tentando descredibilizar a sua atuação como magistrado da mais alta Corte do País”.
Gilmar Mendes foi crítico da Lava Jato quando Moro ocupava o cargo de juiz. No começo deste mês, por exemplo, o ministro do STF criticou Jair Bolsonaro (PL) e o parlamentar do União Brasil, ao dizer que a maior contribuição ex-ocupante do Planalto foi tirar o senador da Vara Federal de Curitiba (PR), onde o congressista julgava os processos da Lava Jato em primeira instância.
Em 20 de abril, o ministro do STF Ricardo Lewandowski manteve na Corte a apuração sobre as acusações de extorsão feitas pelo advogado Rodrigo Tacla Duran contra o parlamentar do União Brasil e o deputado federal Deltan Dallagnol (Podemos-PR), ex juiz e ex-procurador da Operação Lava Jato, respectivamente.
As ilegalidades cometidas por Moro ficaram conhecidas com a Vaza Jato, que foi a publicação na imprensa de conversas dele com procuradores do Ministério Público Federal (MPF-PR). De acordo com os diálogos, o então juiz fazia uma espécie de assistente de acusação ao interferir na elaboração das denúncias, que devem ser feitas por promotores.
Moro tirou Lula da eleição de 2018, ao condenar o petista, e aceitou ser ministro de Bolsonaro. Em 2021, o Supremo declarou a suspeição de Moro nos processos contra Lula, que teve os direitos políticos devolvidos.
Em 2022, o ex-juiz foi derrotado no Tribunal Regional Eleitoral (TRE-SP) por fraude em domicílio eleitoral e ficou impedido de concorrer a uma vaga por São Paulo, e foi disputar no Paraná. País”.
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