Na última quarta-feira (31), o Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) reconheceu que o território de comunidades tradicionais de fundo de pasto de Areia Grande, em Casa Nova (BA), é composto por terras devolutas do estado da Bahia e, portanto, não pertence ao Banco do Brasil, que reivindicava ser proprietário das terras. Há mais de 15 anos, o Banco e dois empresários vinham buscando judicialmente a expulsão de 400 famílias de seu território.
André Sacramento, advogado da Associação dos Advogados/as de Trabalhadores/as Rurais (AATR) que acompanha o caso, explica que essa decisão do TJ-BA é uma vitória para as comunidades, pois reconhece que a ação se trata de grilagem de terras. “Foi um processo longo, de muitas dificuldades, quando nós da AATR assumimos o processo já havia uma sentença de expulsão dos trabalhadores em favor do Banco do Brasil, nós alegamos a grilagem dessas terras, que eram terras que nunca tinham pertencido a fazendas, mas que se tratavam de terras devolutas. Com essa decisão, o TJ-BA nos surpreendeu positivamente reconhecendo que se tratam de terras griladas que não poderiam ter sido passadas para o Banco do Brasil, nem ser alvo da ação de despejo”, afirmou o advogado.
Para Zacarias Rocha, do território de Areia Grande, essa vitória judicial serve de ânimo para a população local continuar na luta por seu território e também para fortalecer outras comunidades que estão passando por situação semelhante. “Isso significa a reafirmação das comunidades de Areia Grande enquanto detentoras do território. As comunidades vêm há séculos fazendo a luta para permanência no seu território, quando Areia Grande ganha, outras comunidades também ganham com isso, porque é o modo de vida desses povos. E também não significa dizer que com essa vitória a luta deva parar”, comentou Rocha.
Histórico do conflito
A área em litígio, o território de Areia Grande, é composto pelas comunidades Melancia, Riacho Grande, Salinas da Brinca, Jurema, Tanquinho, Ladeira Grande, Lagoado, Lagedo, Lagoinha, Pedra do Batista e Pilão. Desde a segunda metade do século XIX, essas comunidades estão no território, vivendo da criação à solta de caprinos e extrativismo.
Na final da década de 1970, Areia Grande foi alvo de um processo escandaloso de grilagem em benefício da empresa Agroindustrial Camaragibe S.A, que acessando recursos do Proálcool, adquiriu “títulos de posses” na área e os registrou no Cartório de Registro de Imóveis de Casa Nova como se fossem propriedade.
Além da fraude no registro, a empresa abandonou o projeto de produção de álcool biodiesel e apropriou-se do financiamento público, deixando uma dívida milionária com o Banco do Brasil, no contexto do chamado “Escândalo da Mandioca”, de repercussão nacional. Como forma de pagamento da dívida, o Banco do Brasil adquiriu o direito sobre os títulos supostamente de propriedade registrados pela empresa nas terras de Areia Grande, e, em 2004, os transferiu para os empresários Alberto Martins Pires Matos e Carlos Nisan Lima Silva.
Em 2006, esses empresários ingressaram com uma ação judicial contra 11 moradores de Areia Grande, acusando-os de invasores e requerendo a imissão daqueles na posse da área, o que foi aprovado pelo juiz de direito de Casa Nova, sem sequer ouvir o Ministério Público.
O cumprimento da decisão causou amplo clamor social, quando no dia 06.03.2008, a região de Areia Grande reviveu situação de terror. Policiais e prepostos dos empresários invadiram a área ocupada secularmente pelas comunidades, destruíram casas, chiqueiros, currais, roçados, árvores centenárias da caatinga, milhares de metros de cercados, levando a prejuízos calculados em mais de um milhão de reais. As ameaças armadas chegaram ao extremo, culminando, em 2009, no assassinato do trabalhador rural José Campos Braga (Zé de Antero), crime que continua impune até hoje.
Texto: Comunicação CPT Juazeiro/BA
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