O governo Lula subiu o tom na articulação para colocar o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega no comando da Vale. Nesta quarta-feira, 24, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, telefonou para conselheiros da empresa para defender que o comitê de acionistas escolha o indicado de Lula para a presidência da companhia. O grupo deverá se reunir na próxima terça-feira, 30, para deliberar sobre a sucessão na mineradora.
A informação foi revelada pelo jornal O Globo e confirmada pelo Estadão com um conselheiro. Procurado, Silveira não se manifestou.
Segundo auxiliares do presidente, Lula deseja que Mantega tenha um papel de destaque no comando da empresa, com voz ativa na gestão, e não seja apenas um coadjuvante. Ele chefiou a pasta da Fazenda de 2006 a 2014.
A saída de meio-termo desenhada para acomodar o interesse dos acionistas privados, como revelada pelo Estadão, segue sobre a mesa, mas a prioridade do Planalto no momento é empoderar Mantega na disputa. Procurada, a Secretaria de Comunicação (Secom) da Presidência da República disse que não iria comentar.
Como revelou o Estadão, auxiliares do presidente e sócios privados elaboraram um arranjo no qual Mantega ocuparia um assento no conselho de administração da Vale, mantendo no cargo por um período mais curto (um ano) o atual presidente Eduardo Bartolomeo. O nome da Cosan no conselho, Luis Henrique Guimarães, seria alçado ao comitê executivo.
Nesta quarta-feira, 24, a informação de que Silveira estava ligando para conselheiros da Vale para dizer que Lula quer o ex-ministro no comando da empresa afetou os preços das ações da mineradora e contribuiu também para derrubar os papéis da Petrobras na Bolsa de Valores (B3). Após acumularem alta de 1,77% no dia, as ações da Vale reduziram o ritmo no fim do pregão e fecharam com alta de 1,01%. A desaceleração coincidiu com a notícia das investidas do ministro de Minas e Energia, segundo analistas. Já os papéis da Petrobras caíram 0,93% (ação ordinária) e 0,76% (ação preferencial).
A operação conduzida pelo governo para tentar emplacar Mantega na presidência da companhia é considerada de alto risco no conselho de acionistas, porque a chance de o ministro ser eleito pela maioria é tratada como improvável. Isso porque o governo já não tem a influência que um dia já teve na mineradora.
Privatizada em 1997, a Vale hoje funciona como uma “corporation”, em que nenhum acionista tem mais de 10% da empresa. Os maiores são a Previ, por meio da qual o governo exerce sua influência, seguida por BlackRock, Mitsui, Cosan e Bradespar. Dos 13 conselheiros, oito são independentes.
Não há dúvida, porém, tanto entre auxiliares do presidente quanto no comitê de acionistas, que o governo aumentou a pressão sobre a empresa e seus acionistas e que tem à disposição instrumentos para “apertar a Vale”, caso considere ser necessário. Citam, por exemplo, direitos minerais e de concessão de ferrovias.
Silveira, no entanto, tem sido pressionado pelo outro lado. Deputados que militam na área de mineração já avisaram ao ministro que, caso se concretize a ação do governo na Vale, vão propor a abertura de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI).
A temperatura no processo de sucessão da Vale vem subindo nessa reta final. O Estadão/Broadcast apurou que parte dos acionistas está desconfortável com a pressão cada vez mais forte que o governo tem feito na última semana.
Além de pressionar diretamente, o governo pode dificultar as obtenções de licenças e concessões, movimentos que interferem na vida da companhia e de seus acionistas. A preocupação desses acionistas é que a política ultrapasse os portões e entre na companhia, como já aconteceu no passado.
Por isso, a insistência de Lula por Mantega acende um sinal de alerta em uma parte do conselho de administração. Os recados que chegaram aos conselheiros é que o presidente não abre mão de ter Mantega com poder para interferir nas decisões da Vale.
De acordo com interlocutores, o presidente Lula não engoliu a demora de Eduardo Bartolomeo, presidente da Vale, para buscar uma aproximação com o atual governo. Nos últimos meses, o executivo aumentou seu trânsito nas esferas políticas, participando de reuniões com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e da Casa Civil, Rui Costa.
Procurada, a Vale informou que não irá comentar
por Mariana Carneiro e Juliana Garçon