A Justiça da Venezuela emitiu, nesta segunda-feira (2), uma ordem de prisão contra Edmundo González, 75, o candidato que representou a coalizão opositora na eleição da qual Nicolás Maduro foi declarado vencedor.
O pedido de prisão foi feito pelo Ministério Público, liderado pelo procurador-geral, Tarek Saab, dias depois de González ignorar pela terceira vez uma intimação da Justiça para que prestasse depoimento no escopo de uma investigação iniciada após opositores acusarem fraude no pleito. A audiência mais recente foi marcada para a última sexta-feira (30), quando a Venezuela sofreu com um apagão em todo o país.
González —que concorreu após a líder da coalizão opositora, María Corina Machado, ser proibida de disputar a eleição— afirmou em outras ocasiões que o Ministério Público atua como um “acusador político” e que seria submetido a um processo “sem garantias de independência ou devido processo legal” caso fosse à audiência.
Um porta-voz de Gonzalez mencionado pela agência de notícias Reuters disse que o opositor não havia sido notificado de qualquer mandado de prisão.
O Ministério Público, por outro lado, havia advertido que, em caso de nova ausência de González, passaria a considerar “risco de fuga e de obstrução”, o que justificaria o mandado. O órgão é alinhado ao chavismo.
O pedido de prisão foi assinado pelo promotor Luis Ernesto Duénez e enviado ao juiz especial de primeira instância que atua em casos relacionados a terrorismo. O Ministério Público divulgou em suas redes sociais uma cópia do documento. González é acusado de desobediência das leis, falsificação de papéis públicos, conspiração, usurpação de funções e sabotagem. Em teoria, os crimes podem resultar na pena máxima de 30 anos de reclusão.
Os crimes se relacionam à publicação e manutenção de um site que reúne atas da votação e que vem sendo usado pela oposição para reivindicar sua vitória.
Segundo as informações publicadas no site, o opositor venceu a eleição com mais de 7,3 milhões de votos (67%), contra 3,3 milhões de Maduro (30%). Várias organizações internacionais independentes afirmaram que as atas divulgadas no endereço eletrônico são verdadeiras, e alguns países chegaram a reconhecer o opositor como legítimo presidente eleito da Venezuela em razão dos boletins.
Mas o regime, que até o momento não divulgou as atas oficiais a despeito da pressão internacional, afirma que os documentos exibidos no site da oposição são falsos. Também declara Maduro o vencedor da disputa, com 52% dos votos, contra 43% de González.
Diante da turbulência polícia, o ex-diplomata não aparece em público desde 30 de julho, quando participou de uma manifestação contra o regime. Desde então, vem limitando sua atuação às redes sociais por temor de represálias.
Movimento semelhante é feito por María Corina, que diz viver escondida em seu país, além de temer ser alvo de repressão. Não há, porém, um mandado de prisão emitido contra ela. “Eles perderam toda a noção da realidade”, escreveu María Corina na rede social X. “Ameaçar o presidente eleito apenas alcançará mais coesão e aumentará o apoio dos venezuelanos e do mundo a González”.
Especialistas afirmam que o processo contra o opositor é irregular. O Ministério Público não especificou nas três intimações se ele estava sendo convocado como acusado, testemunha ou especialista, o que é exigido pela lei venezuelana.
Os documentos falavam apenas em “prestar uma entrevista em relação aos fatos dos quais o órgão investiga” pelo suposto cometimento de “usurpação de funções” e “forjamento de documento público”.
A ordem de prisão foi determinada horas após os Estados Unidos apreenderem, na República Dominicana, um avião usado por Maduro. Segundo o Departamento de Justiça, a ação ocorreu depois de ficar constatado que a compra da aeronave violou as sanções americanas.
De acordo com a CNN, a aeronave foi descrita por autoridades como o equivalente venezuelano ao Air Force One (usado pelo presidente dos EUA) e foi fotografada em visitas de Estado anteriores de Maduro ao redor do mundo. Em nota, o regime venezuelano chamou a ação de pirataria.
Na última quinta-feira (29), véspera da audiência convocada pela terceira vez, González participou por chamada de vídeo de uma reunião com ministros das Relações Exteriores dos países que compõem a União Europeia. Os chanceleres concordaram em não reconhecer a “legitimidade democrática” da reeleição de Nicolás Maduro diante da falta de evidências que comprovariam a vitória do líder chavista.
Por outro lado, os países que integram a UE tampouco concordaram em reconhecer González como presidente eleito da Venezuela.
O mandado de prisão contra González aumenta a lista de opositores que se tornaram alvo do regime após a contestada eleição. No último dia 28, o líder do partido Convergência Venezuela, Biagio Pilieri, foi preso após participar de um comício ao lado de María Corina.
Antes, na terça (27), María Corina havia denunciado o desaparecimento de Perkins Rocha, advogado da oposição e representante deste campo político junto ao CNE. “Querem nos dobrar, nos confundir e nos aterrorizar. Seguiremos adiante”, disse a política na ocasião.
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