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O Mato Grosso do Sul se tornou o último reduto do PSDB em meio ao apequenamento do partido nos anos recentes. Enquanto a sigla perdeu influência no restante do País, principalmente em redutos históricos como São Paulo e Minas Gerais, os tucanos dominam a política sul-mato-grossense há 10 anos. Mesmo com o poder consolidado, o governador tucano Eduardo Riedel defende a fusão do partido com outra sigla — a favorita é o PSD, de Gilberto Kassab —, mas reconhece que a decisão precisa ser tomada de forma conjunta com o restante do partido.
O PSDB alcançou um feito inédito na história do Estado ao vencer três eleições seguidas para governador: Riedel sucedeu Reinaldo Azambuja, que cumpriu dois mandatos e agora preside o diretório estadual. Com 44 prefeitos, os tucanos também comandam mais da metade dos 79 municípios.
Um dos entraves é o debate sobre o modelo da aliança: a fusão implicaria na criação de um partido totalmente novo e abriria espaço para os deputados se filiarem a outras siglas sem perderem os respectivos mandatos. Na incorporação, o PSDB seria absorvido pela sigla de Kassab e deixaria de existir, o que desagrada lideranças como Aécio Neves (PSDB).
O posicionamento de Riedel foi expresso em um almoço na última quinta-feira, 13, em Campo Grande (MS) com a presença de Azambuja, de deputados estaduais e federais e do presidente nacional Marconi Perillo (PSDB). Procurado, Riedel não se manifestou. Azambuja, por sua vez, disse apenas que a conversa foi “ampla e produtiva”. “É um tempo de diálogo e debate. É assim que a gente começa a construir decisões coletivas”, continuou.
Outra possibilidade, discutida abertamente no ano passado, é que o grupo político de Azambuja e Riedel migre para o PL de Jair Bolsonaro. Uma prévia deste movimento ocorreu na eleição municipal, quando os liberais desistiram de lançar candidato a prefeito de Campo Grande (MS) para apoiar Beto Pereira (PSDB).
“O PSDB do Mato Grosso do Sul dialoga, mas não é predominantemente bolsonarista. Se o Bolsonaro vier apoiar, eles abrirão os braços. Com certeza eles estão muito mais próximos do Bolsonaro do que do Lula. Mas no cenário local existem outros grupos políticos bem mais alinhados ao bolsonarismo”, analisou o cientista político Daniel Miranda, que leciona na Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS).
A posição de Riedel favorável à aliança com o PSD vai na contramão da nota divulgada por Perillo na quarta-feira, 12, quando o presidente tucano suspendeu as negociações com outros partidos, ao menos por enquanto, e recuou da possibilidade de fusão ou incorporação. “O PSDB não vai desaparecer”, disse ele, em nota oficial.
O dirigente partidário sugeriu como alternativa ampliar a federação ou a adesão de outras siglas ao PSDB com o objetivo de superar a cláusula de desempenho e continuar ter acesso ao dinheiro do fundo partidário e à propaganda eleitoral gratuita.
O PSDB saiu de 100 deputados federais eleitos em 1998 para 13 em 2022, exatamente o número que terá que conquistar, ao lado do Cidadania, com quem é federado, para superar a cláusula em 2026. O partido não tem mais bancada no Senado, não elegeu vereadores em São Paulo no ano passado e viu o número de prefeitos cair 72% desde o ano de 2000, mais antigo pleito municipal que consta no sistema de estatísticas do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Por outro lado, em parte deste período se consolidou como a principal força de Mato Grosso do Sul. O PSDB também governa o Rio Grande do Sul, com Eduardo Leite, e Pernambuco, com Raquel Lyra — a governadora avalia se filiar ao PSD —, mas não domina a política desses lugares.
“Quando você tem um bom governo, você acaba atraindo prefeitos e lideranças e isso reflete depois na eleição de deputados, senador e governador. Nós temos um ciclo de 12 anos no Mato Grosso do Sul [contando os anos até o fim de mandato de Riedel], com duas grandes gestões do Azambuja e agora do Riedel, que vai para a reeleição em 2026″, disse Perillo ao ser questionado pelo Estadão sobre a força do PSDB em Mato Grosso do Sul.
O presidente tucano avalia que é natural que o partido do governador consiga arregimentar a maior parte das prefeituras de determinado Estado. “Quando a gente tinha o governo de São Paulo, de Minas, de Goiás, do Paraná, do Ceará, a gente também tinha números muito expressivos. Chegamos a ter em Goiás quase metade dos prefeitos eleitos pelo PSDB. É meritório da parte do Azambuja e do Riedel que eles tenham essa força toda, mas é algo um pouco natural”, acrescentou ele.
Daniel Miranda, da UFMS, adota a mesma linha e acrescenta que há menos espaço para a formação de grupos de oposição no Estado devido ao baixo número de cidades e poucas vagas para deputado federal (8) e deputado estadual (24), o que acaba favorecendo a hegemonia do governo estadual de turno.
O cientista político diz ainda que o ponto de virada para o PSDB, que até então era uma espécie de linha-auxiliar do MDB, foi a candidatura de Azambuja a prefeito de Campo Grande em 2012. O tucano sequer foi para o segundo turno, mas saiu maior da eleição e conseguiu se eleger governador dois anos depois.
Na mesma época, o MDB, que dominava a política local, sofreu rachas internos após derrotas eleitorais, se enfraqueceu e ainda assistiu a lideranças, como o ex-governador André Puccinelli, serem alvo de uma versão local da Operação Lava Jato. O mesmo ocorreu com o PT, que governou o Estado por dois mandatos, e tinha como nome de maior destaque o ex-senador Delcídio Amaral, que entrou na mira da Lava Jato.
“Não foram bons anos para o PT, nem nacionalmente nem aqui. Os grupos mais à direita que poderiam fazer oposição ou opor alguma resistência ao PSDB estavam rachados ou enfraquecidos”, afirmou Miranda ao concluir a explicação sobre a ascensão dos tucanos.
Pedro Augusto Figueiredo/Estadão/Foto: Saul Schramm Jr/Governo de Mato Grosso do Sul