PF trocou quase todos os postos de comando desde o começo da atual gestão

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A atual direção da Polícia Federal fez trocas em praticamente todos os postos de comando do órgão desde o início de sua gestão, em janeiro de 2023. O diretor-geral, Andrei Rodrigues, fez mudanças em todas as diretorias e em 26 das 27 superintendências do órgão.

Houve substituições nas 13 diretorias e na corregedoria da PF nesse período, com trocas de diretores e coordenadores. Mudaram de diretor mais de uma vez cinco delas. Em 12, houve mais de uma substituição de coordenador.

Treze superintendências regionais passaram por mais de uma troca desde o início do governo Lula (PT): as de Alagoas, Amazonas, Amapá, Distrito Federal, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Maranhão, Pará, Paraíba, Rio de Janeiro, Rondônia e São Paulo.

A única superintendência que não passou por uma troca de comando foi a do Rio Grande do Sul, estado de origem do diretor-geral.

Tradicionalmente, as trocas de cargos de chefia na Polícia Federal ocorrem em maior volume quando um novo diretor-geral toma posse, e por isso costumam ficar concentradas nos primeiros meses de gestão. Depois, há mudanças pontuais.

Andrei fez substituições em ritmo maior do que antecessores recentes no início da gestão e no período subsequente.

Maurício Leite Valeixo, que assumiu a direção-geral da Polícia Federal no governo Jair Bolsonaro (PL), em janeiro de 2019, substituiu 12 superintendentes nos três primeiros meses e fez mais três trocas até deixar o cargo, em abril de 2020, em meio a uma crise provocada pela pressão do então presidente sobre a PF.

Andrei ocupa o cargo desde o início do governo Lula e está perto de completar dois anos e meio no posto. Nos três primeiros meses de gestão, foram 21 trocas de superintendentes regionais. Desde então, houve outras 18 substituições nesses cargos.

Interlocutores do diretor-geral afirmam, de forma reservada, que a rotatividade não é atípica e que as substituições têm sido motivadas por diferentes razões, como reestruturação interna, realocação de funções e questões pessoais.

A Polícia Federal foi procurada, mas não se manifestou até a publicação da reportagem.

Uma das mudanças recentes ocorreu na DIP (Diretoria de Inteligência Policial), setor que concentrou os principais inquéritos envolvendo Bolsonaro. O diretor Rodrigo Morais foi indicado para o cargo de adido policial em Londres, substituído por Leandro Almada, que era superintendente no Rio de Janeiro.

Na PF desde 2008, Almada acumula experiência em investigações e cargos de liderança. Foi o responsável pelo inquérito sobre a tentativa de obstrução de investigações do assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes.

A DIP também é o setor responsável por definir a política de inteligência e realizar ações de contrainteligência e investigações sobre terrorismo. Até 2022, os delegados vinculados à área dirigiam inquéritos geralmente relacionados à segurança nacional.

Na gestão atual, a DIP passou a concentrar investigações em tribunais superiores, como os inquéritos sobre as milícias digitais, que incluem os planos golpistas de Bolsonaro e aliados, além do uso ilegal de sistemas de monitoramento por integrantes da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) e do episódio em que o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal), Alexandre de Moraes, foi hostilizado no aeroporto de Roma.

Na atual gestão, ao menos 13 diretores, coordenadores e superintendentes foram nomeados para cargos de adido ou oficial de ligação no exterior. Os cargos são vistos como prêmio na corporação.

Após assumir o comando da PF, o diretor-geral afirmou que adotaria critérios técnicos para essas nomeações. Agentes ouvidos pela reportagem relatam que a escolha final ainda é do diretor-geral.

Uma portaria publicada em fevereiro, que abriu novas vagas, prevê análise cadastral, avaliação curricular e entrevista. O texto estabelece, no entanto, que “o diretor-geral indicará, dentre os servidores considerados aptos nas fases anteriores, aqueles que integrarão as missões”.

“Existe um processo, mas falta objetividade. O candidato precisa cumprir os requisitos formais para se habilitar, mas, no fim, quem acaba sendo escolhido é alguém indicado pelo diretor-geral”, afirma Marcus Firme, presidente da Fenapef (Federação Nacional dos Policiais Federal).

Entre os indicados está Thiago Severo de Rezende, designado em junho do ano passado para o posto de oficial de ligação junto à Europol (agência policial da União Europeia) em Haia, na Holanda. Antes, ele ocupava o cargo de coordenador-geral de Contrainteligência da DIP.

A nomeação ocorreu duas semanas antes de Rezende decidir pelo indiciamento —revertendo a posição anterior da corporação— do empresário Roberto Mantovani Filho, de sua esposa e de seu genro, suspeitos de hostilizar Moraes e familiares em Roma, em 2023.

Pessoas próximas ao diretor-geral afirmam que hoje há mais transparência do que existia anteriormente e que qualquer policial que seja capacitado tem condições de concorrer a um cargo, sem a necessidade de arranjos políticos.

Outra mudança ocorreu na Diretoria de Cooperação Internacional. O diretor Valdecy de Urquiza e Silva Júnior deixou o cargo após ser eleito secretário-geral da Interpol —tornando-se o primeiro brasileiro a assumir a posição. Em seu lugar, assumiu o delegado Felipe Tavares Seixas.

A mudança foi vista como positiva e de grande relevância para o Brasil, considerando que, em mais de cem anos de existência, a Interpol sempre teve sua secretaria-geral ocupada por europeus ou norte-americanos.

Nas superintendências regionais, dois chefes foram designados para cargos de adidos. Rogério Giampaoli, que chefiava a superintendência em São Paulo, foi nomeado para o Chile. Agnaldo Mendonça Alves, ex-superintendente em Mato Grosso do Sul, assumiu o posto de adido no Paraguai.

Outras mudanças podem ocorrer na Polícia Federal. O diretor-geral tenta emplacar o nome do diretor de Investigação e Combate ao Crime Organizado e à Corrupção, Ricardo Saadi, no Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras).

O órgão vinculado ao Banco Central tem, entre outras funções, o papel de produzir relatórios de inteligência financeira que costumam subsidiar investigações a partir da identificação de movimentações bancárias consideradas atípicas.

O nome enfrenta resistência no Congresso e entre alguns ministros do STF. Há temor de uma influência excessiva da PF sobre um órgão que tem acesso a informações sensíveis de movimentações bancárias.

Raquel Lopes/Constança Rezende/Folhapress/Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil/Arquivo

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