Racismo direcionado a Vini Jr. revela tratamento diferente dado a atletas brancos e negros

Uncategorized
 Foto: Manu Fernandez/AP

ofensa racista de que foi vítima Vinicius Junior suscitou um questionamento no Brasil e na Espanha. Por que o tratamento com relação a jogadores negros que comemoram gols dançando não é o mesmo dado a atletas brancos que também celebram seus gols com dança? O francês Antoine Griezmann, meia-atacante do Atlético de Madrid, por exemplo, tinha o hábito de festejar com uma dancinhas ligadas ao Fortnite, um jogo de videogame.

“Esses ataques vêm, geralmente, porque os atletas são negros”, explica Marcelo Carvalho, diretor do Observatório de Discriminação Racial, sintetizando a questão. Para ele, existe uma frustração de pessoas preconceituosas ao ver o negro alcançando protagonismo no futebol ou em outra área.

“O racista se acha esse ser superior e, quando uma pessoa negra avança de patamar de sucesso e visibilidade, o racista vai procurar algo para atacar a pessoa negra”. Sua organização é dedicada a pesquisar e discutir o racismo no esporte, além de mapear episódios racistas no futebol nacional.

Mobilização em defesa de Vini Jr.

Se existe algo positivo engendrado pelo ataque racista na Espanha direcionado a Vinicius Junior é a mobilização de figuras importantes do futebol, como Pelé e Neymar, e instituições e clubes em defesa do atacante brasileiro. Esse movimento não é – ou não vinha sendo – tão comum no País, mas, desta vez, a injuria racial de que foi vítima o jogador do Real Madrid provocou indignação e fez principalmente os atletas se unirem.

Pelé escreveu que o futebol “é alegria, é “uma dança” e uma “verdadeira festa. Neymar disse para Vini Jr. continuar bailando e “ser feliz do jeito que é”. Lucas Paquetá avisou “que é só o começo” e Bruno Guimarães, condenou com contundência o ataque racista que partiu de Pedro Bravo, presidente da Associação Espanhola de Empresários de Jogadores, segundo o qual, o brasileiro deveria “parar de fazer macaquice”. O volante do Newcastle afirmou que “é incompreensível se esse cidadão não for preso”.

De acordo com Carvalho, essa mobilização orgânica de nomes relevantes do futebol mundial representa uma mudança de comportamento do atleta brasileiro, geralmente quieto em sua “bolha”, avesso a pautas sociais e desacostumado a se posicionar endossando o combate a preconceitos.

“Estamos percebendo que os jogadores estão quebrando esse silêncio. Está havendo uma mudança de comportamento. Os jogadores estão entendendo o lugar de não aceitar essa opressão, essa violência e estão se manifestando cada vez mais”, opina.

“Acho que a tendência é aumentar porque, no caso do Vini Jr., vemos inclusive a manifestação da CBF. A partir do momento que as instituições se posicionam, outros atletas fazem o mesmo. Isso vai crescendo. Vemos isso na NBA, por exemplo”, acredita o diretor do Observatório da Discriminação Racial.

De fato, a fala racista em um programa de televisão espanhol fez até a CBF se manifestar. “Vai ter dança, drible, mas, acima de tudo, respeito”, diz uma postagem no perfil da entidade máxima do futebol brasileiro. O próprio Vini Jr. respondeu à publicação, prometendo que virão “muito mais bailes!”.

Na opinião de Carvalho, apenas punições rígidas são capazes de reduzir o número de episódios de injúria racial, no esporte e em todos os outros segmentos da sociedade. “Se os atletas cobrarem na Espanha, esse racista pode ser punido. A partir do momento em que tivermos punições exemplarem, os racistas vão começar a diminuir esse discurso de ódio”.

Posicionamento da CBF

Ações antirracistas, cabe dizer, passaram a ser priorizadas na gestão de Ednaldo Rodrigues. Depois que ele assumiu a presidência, a CBF organizou um Seminário de Combate ao Racismo e à Violência no Futebol e propôs que haja a perda de um ponto na tabela de classificação do Brasileirão para cada caso de racismo envolvendo os times a partir do próximo ano.

Rodrigues também não se furtou de defender Vini Jr. “Nenhum ser humano merece ser vítima de xingamentos racistas. Minha solidariedade ao Vinicius Junior. A CBF repudia sempre qualquer manifestação neste sentido. É lamentável ainda ouvirmos declarações deste tipo no século 21?. Ele foi eleito em março deste ano para o cargo mais eminente da instituição que organiza o futebol no País, e é o primeiro negro a comandar a CBF.

“Sou a favor da aplicação de multas financeiras em montantes significativos, da perda de pontos, mas é preciso deixar claro que nada disso terá efeito concreto de forma isolada. É necessário também que se responda criminalmente”, contestou o baiano que preside a CBF.

O Real Madrid também se posicionou. Garantiu que vai “mostrar todo o seu amor e apoio a Vinicius Junior”, e enalteceu o jovem brasileiro, “um jogador que entende o futebol como uma atitude perante a vida baseada na alegria, respeito e esportividade”. Também informou que irá tomar medidas legais contra qualquer pessoa que use expressões racistas contra seus jogadores. O Estadão procurou a Fifa com o propósito de saber se a entidade máxima do futebol irá se expressar a respeito do caso, mas não recebeu retorno até a publicação deste texto.

Outros clubes, como Atlético-MG, Cruzeiro, Grêmio e o Flamengo, formador de Vini Jr. deram seu apoio ao jovem atacante brasileiro. Xavi, técnico do rival Barcelona, também disse ser a favor de o atleta dançar. “Cada um comemora como quer. Deixe cada um fazer o que quiser, desde que não desrespeite ninguém”, comentou.

por Ricardo Magatti Estadão

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *