Após terminar o primeiro turno em quarto lugar, Ciro Gomes (PDT) adiou por “algumas horas” o anúncio sobre seu posicionamento para o segundo turno. “Nunca vi uma situação tão complexa, tão desafiadora, tão potencialmente ameaçadora sobre a nossa sorte como nação”, disse ele na noite deste domingo (2).
“Por isso, peço a vocês mais algumas horas para conversar com meus amigos, conversar com meu partido, para que a gente possa achar o melhor caminho, o melhor equilíbrio para bem servir a nação brasileira”, continuou o candidato, que teve cerca de 3,5 milhões de votos, ou 3% do total.
Em comparação à eleição presidencial anterior, Ciro teve forte queda. Em 2018, obteve 13,3 milhões de votos (12,5% do total). Agora, também perdeu o terceiro posto, superado por Simone Tebet (MDB).
Mais cedo, após votar em Fortaleza, indicou que essa deve ser sua última eleição como candidato, ganhando ou perdendo. “Se vencer não tentarei a reeleição, trabalharei para o fim dela. Se perder, quero ajudar os jovens a pensar o Brasil. Tudo pode mudar, quero deixar registrado, mas hoje penso que é a minha última eleição, quero ficar e curtir meus filhos e meus netos”, disse ele.
O pedetista também amargou uma derrota no Ceará, seu berço político, onde ficou em terceiro lugar, com 6,73% dos votos. Seu candidato ao governo estadual, Roberto Cláudio (PDT), com 14,13%, foi derrotado pelo petista Elmano de Freitas já no primeiro turno. O eleito obteve 53,51% dos votos.
Nas outras três eleições que disputou, Ciro sempre terminou em primeiro lugar no estado. Em 1998, registrou 34,2% –Luiz Inácio Lula da Silva (PT) teve 32,8%, e Fernando Henrique Cardoso (PSDB), 30,3%.
Quatro anos depois, quando o petista foi eleito pela primeira vez à Presidência, o pedetista registrou 44,5% dos votos em seu reduto, ante 39,4% de Lula. Em 2018, Ciro conquistou 40,95% no estado, seguido de Fernando Haddad (PT), com 33,1%, e de Jair Bolsonaro (PL), com 21,74%.
Com dificuldade de forjar alianças devido ao cenário de polarização, a campanha de Ciro apostou, nas últimas semanas, em ataques ao ex-presidente Lula e no discurso contra a bandeira do voto útil, o que gerou reações de apoiadores e de integrantes do PDT. Diante da chance de vitória petista no primeiro turno, apoiadores famosos de Ciro, como os cantores Caetano Veloso e Tico Santa Cruz, declararam voto em Lula como estratégia para evitar que a disputa com Bolsonaro chegasse ao segundo turno.
O movimento de tirar votos de Ciro foi incentivado pelo PT e suscitou forte reação na reta final, levando o candidato a lançar uma carta manifesto endereçada à nação brasileira em que reafirmou sua candidatura à Presidência, apesar da “campanha de intimidação, mentiras e de operações de destruição de imagens” da qual foi vítima, segundo o texto. No mesmo dia, Caetano lançou a iniciativa “tira Ciro” nas redes sociais.
Guiado pela estratégia de tentar furar a bolha bolsonarista e a polarização política, Ciro foi a programas que dialogam com eleitores de centro-direita e de Bolsonaro nas últimas semanas de campanha.
No início de setembro, deu entrevista ao programa Pânico, da Jovem Pan, emissora considerada a voz do bolsonarismo, em que declarou que “Lula tinha filho ladrão e Bolsonaro tem filho respondendo por coisas de corrupção”. A fala foi alvo de ação na Justiça por parte da família do ex-presidente.
Ele também concedeu entrevista de duas horas ao programa do podcaster e youtuber Bruno Aiub, conhecido como Monark, desligado do Flow após defender o direito de existência de um partido nazista.
Na conversa, Ciro disse que “Lula sempre foi fascistóide”. O pedetista explicava sua proposta de taxar grandes fortunas quando atacou o adversário. “Qual é meu problema? Os super-ricos sabem que eu defendo isso e estão matando a pau porque não tenho nem o direito de ser candidato. Se depender do fascismo de esquerda, nem direito de ser candidato, para o povo ter uma opção, eu devo ter”.
As reações da esquerda fizeram com que ele recebesse apoio de parte da direita e apelidos como “Bolsociro” e “Cironaro”. As piadas que sugeriram uma guinada à direita de Ciro ganharam força após o penúltimo debate, no SBT, quando ele foi flagrado cochichando ao pé do ouvido de Bolsonaro no intervalo.
Desde a convenção nacional em que seu nome foi confirmado como candidato do PDT à Presidência, Ciro já vinha equiparando o petista a Bolsonaro. A estratégia de se aproximar do eleitor de centro-direita, porém, não se mostrou eficiente, e o candidato do PDT oscilou entre 7% e 9% das intenções de voto nas pesquisas realizadas pelo Datafolha ao longo da campanha. Terminou a corrida com 3%.
Embora tenha se colocado como o único presidenciável com um plano de governo robusto para debater, a campanha do pedetista acabou dando mais espaço aos embates com os adversários políticos.
Na reta final, uma esquete em que dois ladrões conversam sobre o país foi veiculada no canal Ciro TV, no YouTube, criado pela campanha para tentar contornar o pouco tempo de TV, consequência da falta de articulação para se aliar a outros partidos. Ciro também mostrou dificuldade em dialogar com os mais pobres, principalmente ao comunicar suas críticas ao modelo econômico adotado pelos últimos governos.
Em uma agenda no Rio com a presença de empresários, disse ser um “serviço pesado” explicar seu diagnóstico e suas propostas para a economia do país a moradores de favelas. A declaração foi alvo de críticas nas redes sociais e depois rebatida pelo pedetista, que afirmou estar sendo alvo de hipocrisia.
Mariana Zylberkan/Danielle Brant/Folhapress