‘Estou sangrando por dentro’: no DF, bolsonaristas aguardam volta para casa

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Os aposentados Davi Lima, 75 anos, e Osmar Freire, 64, que vieram da Bahia: ‘Quem é patriota não quebra nada, não faz aquilo’ Imagem: Jéssica Lima/UOL

Os primeiros ônibus com destino à Rodoviária Interestadual de Brasília saíram por volta das 8h da última terça-feira (10), na Academia Nacional da Polícia Federal. Nos coletivos, estavam apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro, detidos por estarem acampados no Quartel General do Exército após participarem da manifestação antidemocrática que terminou em depredação no domingo (8). Escoltados por viaturas da Polícia Civil, os grupos foram desembarcados no terminal para que voltassem às suas casas.

A movimentação na rodoviária permanece atípica desde então. Em vez de malas, na noite de terça o saguão do terminal ficou tomado por bancos, barracas e roupas em sacos de lixo. Com expressões de tristeza, manifestantes estavam sentados no chão e pediam à imprensa que não se aproximasse. Poucos usavam verde e amarelo.

Sem audiência de custódia

Sem audiência de custódia Estão voltando para casa aqueles que foram liberados pelos policiais e não precisaram passar por audiência de custódia. Davi Lima, 75, era um deles. Aposentado, aguardava um ônibus para Juazeiro, município localizado no Vale São-Franciscano da Bahia. O idoso estava na companhia do amigo Osmar Freire, 64, também aposentado. Eles vieram ao Distrito Federal especialmente para participar da manifestação de domingo. Ambos estavam acampados há mais de 65 dias na Bahia — por não concordarem, como dizem, com o resultado das eleições. Emocionados, contaram à reportagem do TAB que chegaram a Brasília no sábado e foram detidos e levados para a Polícia Federal na segunda-feira.

“Enfrentamos mais de dois dias de ônibus pra chegar no Distrito Federal”, conta Lima. “O objetivo era fazer uma manifestação pacífica. Mas infelizmente infiltrados do PT foram até lá e a quebradeira começou [a falsa versão de que a destruição na Praça dos Três Poderes foi causada por ‘esquerdistas infiltrados’ foi disseminada nos grupos de WhatsApp e redes sociais bolsonaristas]. Eu estava de longe quando vi aquilo tudo fui embora, fui pro acampamento no QG. Quem é patriota não quebra nada, não faz aquilo”, afirma o aposentado.

‘Sentimento de luto’

Na rodoviária, em vez de malas, cadeiras, barracas e roupas em sacos de lixo Imagem: Jéssica Lima/UOL.

Freire veio para o Distrito Federal com o mesmo objetivo. Deixou a mulher e os filhos na Bahia para se juntar ao grupo. “Eu nem consigo falar, que já tenho vontade de chorar. Não consigo explicar a tristeza que estou sentindo. É como se eu tivesse perdido alguém, um sentimento de luto”, diz. Um dos poucos viajantes que usava uma camisa do Brasil, o aposentado disse estar decepcionado com as autoridades, o Exército e a polícia. “Acreditei que nossa voz poderia mudar o destino do Brasil. Estou sangrando por dentro. Não fomos maltratados na Academia da Polícia Federal. Nos deram comida, água. O que estou querendo dizer é que temo pelo futuro do Brasil e estou voltando para casa, frustrado, decepcionado, apavorado.”

Enquanto os idosos conversavam com a reportagem, duas mulheres se aproximaram e os orientaram a não falar mais. “Muito cuidado, eles deturpam tudo. Entrevistas só pra fora do país”, ordenaram. Um homem com boné e camiseta estampando a bandeira do Brasil concordou em conversar com a reportagem sem se identificar. Morador de Cuiabá, no Mato Grosso, de 43 anos, disse que também chegou no sábado para participar das manifestações. Assim como a maioria, acredita que os atos de vandalismo ocorreram devido a pessoas infiltradas. Ele afirma estar decepcionado com as Forças Armadas e que as instituições, principalmente o Exército e a polícia, não estão 100% com o ex-presidente.

Ameaças

Homem que afirmara ser teólogo, mudou de ideia e tentou intimidar a reportagem dizendo ser policial civil Imagem: Jéssica Lima/UOL

“Vou voltar triste, com uma dor no peito e um sentimento de injustiça. Mas a luta continua. Cada um na sua cidade, no seu estado. O povo quer Lula fora do poder e vamos conseguir”, diz o homem, enquanto aguarda para comprar uma passagem de volta a Cuiabá — a 1070 km de Brasília. Após a conversa, ele autorizou que a reportagem fotografasse suas vestimentas. Foi quando uma terceira mulher abordou o rapaz e disse que tudo o que ele havia falado seria “modificado”. “Eu sou policial civil e não autorizo minhas fotos. Apague todas, senão vou atrás de você e acabo com isso”, ameaçou o homem, que até então tinha se identificado como teólogo. Gravando com o celular nas mãos, a mulher exigiu que a reportagem repetisse nome, sobrenome e veículo onde a matéria seria divulgada. “Vocês jornalistas são todos uns falsos, sonsos, mentirosos. Se você mudar uma vírgula, não vai se dar bem“, disse a mulher.

Fonte: tab.uol.com.br

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