EUA reconhecem Brasil como interlocutor no novo mundo multipolar

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O Brasil se consolida como um interlocutor incontornável no novo mundo multipolar ao qual os Estados Unidos e a União Europeia tentam se adaptar. Na visão de integrantes dos governos brasileiro e americano e de analistas, a volta do país ao cenário global, após anos de isolamento durante o governo de Jair Bolsonaro, firmou-o como porta de entrada para entender o Sul Global, o grupo dos países emergentes.

O Planalto e o Itamaraty comemoraram as últimas viagens do presidente Lula –à cúpula dos Brics na África do Sul, ao G20 na Índia, ao G77 em Cuba, à Assembleia-Geral da ONU e bilateral com o presidente americano, Joe Biden, e com o ucraniano Volodimir Zelenski em Nova York. Eles acreditam que as visitas foram um sucesso e encerram o primeiro grande ciclo de política externa do governo Lula.

Segundo um integrante do governo, a ideia era colocar o Brasil de novo dentro do campo. Na sua visão, não só o Brasil voltou a jogar, como já está na pequena área.

Na visão do governo, a ampliação dos Brics, o desenlace da cúpula do G20, com derrota do G7 devido à exclusão da menção à Rússia no documento final, e a articulação dos emergentes em foros de política ambiental indicam que o empoderamento dos emergentes veio para ficar, e que o Brasil tem papel importante.

Agora, começa o segundo ciclo, que não é mais de normalização da política externa pós-Bolsonaro, mas de normalidade, com resgate de bandeiras caras ao Itamaraty: multilateralismo, integração da América Latina e solução pacífica de controvérsias.

O fato de o Brasil sediar a Cúpula do G20 no ano que vem, a primeira reunião dos Brics ampliados em 2025, e a COP 30 em Belém no mesmo ano fortalece ainda mais o papel do Brasil como elo entre o Sul Global e as nações ricas.

Dentro do governo americano, há um reconhecimento de que haverá diferenças nas visões de mundo de Brasil e Estados Unidos –notadamente a posição brasileira em relação à Guerra da Ucrânia e seu relacionamento com a China, arqui-inimiga de Washington na versão atual da Guerra Fria.

Mas existe a percepção de que, entre os países originais dos Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), o Brasil é o que tem valores, sistema democrático e de respeito a direitos humanos mais próximos dos europeus e americanos. São duas democracias ocidentais, com sensibilidade social que tiveram o sistema eleitoral atacado pela extrema direita e ainda enfrentam essa ameaça.

“Os Estados Unidos e a União Europeia se dão conta de que há uma grande mudança na ordem mundial e o governo americano trabalha em uma nova estratégia para lidar com o mundo multipolar”, diz Nick Zimmerman, diretor-fundador da consultoria Dinámica Americas e diretor para Brasil e Cone Sul no Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca durante o governo Obama.

“O Brasil é cada vez mais importante nesse novo mundo multipolar, e Washington entende que o país tem seus próprios interesses, mas há muito espaço para cooperar”, acrescenta.

A iniciativa em defesa dos direitos dos trabalhadores frente aos desafios tecnológicos, climáticos e econômicos, lançada pelos presidentes Joe Biden e Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em Nova York, é vista como um símbolo de valores compartilhados pelos dois países e possibilidade de cooperação estratégica.

“A delegação brasileira em Nova York, incluindo o presidente Lula, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, deixaram uma impressão muito positiva entre representantes do setor privado e do governo americano.”

Em Brasília e Washington, a reunião bilateral entre Biden e Lula foi considerada um sucesso. Os dois líderes se deram bem e houve química –ao contrário do relacionamento do petista com Barack Obama, que era muito mais distante. Foi mais parecido com o ambiente de camaradagem que Lula cultivou com o ex-presidente George W. Bush.

Patrícia Campos Mello / Folha de São Paulo

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