‘Bastante gelo’, disse copiloto da Voepass pouco antes de queda do avião, indica relatório prévio

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O copiloto Humberto de Campos Alencar e Silva disse que havia “bastante gelo” um minuto antes da queda do avião da Voepass. O relato dele coincidiu com alertas emitidos pela aeronave de congelamento de partes da aeronave.

Apenas 57 segundos após o alerta do copiloto, registrado na caixa-preta, os pilotos perderam o controle sobre a aeronave e ela virou de um lado para o outro até a aeronave entrar em parafuso, completar cinco voltas e atingir o chão.

As informações foram divulgadas nesta sexta-feira (6) pelo Cenipa (Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos), da Força Aérea Brasileira. Elas fazem parte do relatório preliminar sobre a queda do avião em Vinhedo (SP). O acidente, em 9 de agosto, matou as 62 pessoas a bordo (58 passageiros e quatro tripulantes).

A apresentação foi feita pelo tenente-coronel Paulo Mendes Fróes, investigador-encarregado pelo caso. Segundo o início da apuração do Cenipa, as luzes que indicam o acúmulo de gelo na parte externa do avião foram ligadas às 12h14 —16 minutos após a decolagem de Cascavel (PR).

As condições meteorológicas indicavam alto índice de formação de gelo em trechos do trajeto feito pela aeronave. “Temos informações meteorológicas disponíveis antes do momento da decolagem. Era previsto gelo severo na rota e previsão de formação de gelo nos níveis de 12.000 pés a 21.000 pés”, disse Fróes.

A tripulação ligou o sistema de degelo por três vezes durante o voo, diante dos alarmes emitidos pela aeronave. A última vez que o mecanismo para quebra do gelo foi ligado pelo piloto Danilo Santos Romano ocorreu 5 segundos após o copiloto Humberto alertar sobre o acúmulo de gelo.

Segundo Fróes, no mesmo minuto a caixa-preta registrou “ruídos e vibrações” que indicam ser o momento em que os pilotos perderam o controle sobre a aeronave. O avião fazia uma curva em direção ao aeroporto de Guarulhos, destino final do voo.

O diretor do Cenipa, brigadeiro Marcelo Moreno, afirmou que a caixa-preta que grava a voz da cabine registrou um tripulante dizendo que o sistema de degelo não funcionava da forma correta. Ainda não foi possível, segundo Marcelo, confirmar essa informação com outros dados sobre a aeronave.

“Um tripulante disse, na gravação de voz, que havia problema no sistema deicing (degelo) […] O comentário de que haveria falha no sistema deicing é apenas por voz, não conseguimos confirmar no FDR (caixa-preta com os dados da aeronave)”, disse.

O avião modelo ATR 72-500 deixou Cascavel (PR) às 11h58 com destino ao aeroporto de Guarulhos (SP). O voo seguiu sem sobressaltos até 13h20.

A aeronave sobrevoava o estado de São Paulo a cerca de 5.000 metros de altitude quando, às 13h21, fez uma curva brusca e começou a cair.

O avião caiu em parafuso chato —movimento em que a aeronave gira em torno de seu próprio eixo. A queda ocorreu no condomínio Recanto Florido, no bairro Capela, em Vinhedo. Ninguém no solo se feriu.

O desastre é o mais letal do país desde 2007, quando um acidente com o voo 3504 da TAM nos arredores do aeroporto de Congonhas deixou 199 mortos, e um dos dez piores já registrados no Brasil.

O Cenipa investiga as possíveis causas do acidente para emitir recomendações que busquem impedir novos desastres como o que ocorreu com a Voepass. A apuração da Força Aérea não aponta culpados nem tem objetivo de responsabilizar pessoas ou empresas.

A investigação é feita em três etapas. A primeira, no dia do acidente, envolve o recolhimento de destroços e reconhecimento do local em que a aeronave caiu.

A segunda fase é a análise dos dados para identificar as possíveis causas do acidente. É nesse momento que o Cenipa se encontra. Um dos principais componentes para entender a dinâmica da tragédia é a análise das caixas-pretas do avião.

As aeronaves comerciais no Brasil possuem duas caixas-pretas: uma que grava o áudio do piloto e do copiloto, outra que registra dados da aeronave.

Os dados de ambas as caixas-pretas foram retirados com sucesso na mesma semana do acidente. O arquivo de áudio, de cerca de duas horas, gravou gritos e o copiloto Humberto de Campos Alencar e Silva falando em dar potência à aeronave nos minutos finais, segundo informações divulgadas pelo Jornal Nacional, da TV Globo.

A análise dos dados tem foco em três pilares. São eles o fator humano, para checar aspectos fisiológicos e psicológicos; o fator operacional, cujo foco é a interação entre os pilotos e as decisões tomadas diante das condições meteorológicas; e o fator material, para verificar se o acidente teve relação com problemas em sistemas do avião.

Com todas as informações, o Cenipa faz uma simulação do voo para analisar como cada um desses fatores pode ter contribuído para o desastre.

A terceira fase é a produção do relatório final e definição das recomendações. A expectativa de integrantes da Força Aérea e pessoas ligadas à Voepass ouvidas pela reportagem é que o Cenipa sugira novos parâmetros para a aviação regional, com aumento de exigências mínimas para a operação comercial.

Uma semana após o acidente, a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) iniciou uma operação assistida da Voepass. Esse formato de fiscalização determina que a empresa aérea envie, em tempo real, todos os dados de operação de suas aeronaves.

Cézar Feitoza/Folhapress/Foto: Divulgação/SSP-SP

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