Disputa entre Leão e Otto pode polarizar mais do que a de governo depois de escolha petista, avalia cientista político

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Foto: Arquivo

O cientista político e professor da Universidade Federal da Bahia Paulo Fábio Dantas Neto considera que o vice-governador João Leão (PP), à primeira vista, tem mais a ganhar numa associação com o ex-prefeito de Salvador ACM Neto (União Brasil) do que com a manutenção da aliança de 11 anos com o PT, que governa o Estado desde 2007. Por outro lado, Paulo Fábio também não visualiza uma revanche do governador Rui Costa (PT) contra Leão.

Dantas Neto afirma, nesta exclusiva ao Política Livre, porém, não ver motivos para apontar a chapa ‘Leão-Neto’ como “imbatível”, conforme sustentado por integrantes de PP e do União Brasil. “É verdade que Neto, por ora, é favorito, mas uma possível disputa ao Senado entre Otto Alencar e João Leão tem tudo pra ser muito renhida e talvez polarize mais do que a de governador, ainda que não se trate de uma polarização ideológica”, afirma o professor.

O cientista político também ressalta que a pouca influência do  pleito nacional nas eleições estaduais seria um fato inédito em se tratando de Bahia. “Nem ACM, o avô, logrou essa estadualização radical. Sempre o fator nacional contou muito e penso que dessa vez não será diferente”, analisa.  A força de Lula é uma das apostas do candidato petista, Jerônimo Rodrigues, para ter seu nome alavancado na disputa.

Confira abaixo os principais trechos da entrevista, concedida quando ainda não havia sido noticiado o rompimento do PP com o governo estadual:

Política Livre – Na avaliação do senhor, o descumprimento de um acordo do PT com o PP do vice-governador João Leão é a principal motivação para esse provável divórcio ou esse seria um desfecho previsível após a união de cerca de 11 anos entre partidos políticos ideologicamente opostos?

Paulo Fábio Dantas – Penso que você usa o adjetivo adequado, ao dizer que o rompimento é provável mas sem dá-lo ainda como certo. À primeira vista, Neto tem mais a oferecer a Leão e ao PP neste instante. Primeiro, pela compatibilidade maior com a política nacional do partido, se tomarmos em conta as posições atuais (do ministro da Casa Civil) Ciro Nogueira (PP-PI) e mesmo de Arthur Lira (PP-AL) e, segundo, uma chance de disputar o Senado ainda que contra um adversário forte que se encontra no exercício do mandato. Leão tem alguma chance porque pode juntar à força do seu PP, a do próprio Neto e a dos partidos de oposição e ainda se beneficiar da relação amistosa que tem e mantém com o governador atual. Ainda que Rui supere os atritos e a insatisfação com a impossibilidade de concorrer ao Senado por ter que ceder lugar a Otto Alencar e entre de fato na campanha desse último em nome da unidade em torno de Lula, não o vejo tendo uma atitude hostil a Leão, acionando a máquina para reverter o voto das bases do PP.

Um terceiro ponto é que, liderando as pesquisas e ao que tudo indica com mais folga após a retirada de Wagner, ACM Neto oferece uma real expectativa de poder estadual que atrai não só o vice-governador, como a bancada de deputados do PP. Por fim, um fator da maior importância: até aqui parece que os deputados do PP avaliam que marchar com ACM Neto seja melhor também a curto prazo, para suas reeleições. E, como se sabe, a formação de bancadas passou a ser, na atual conjuntura nacional, um objetivo estratégico muito mais importante para qualquer partido brasileiro. De modo especial para o PP que quer ter a maior bancada na Câmara. Colar num candidato favorito ao governo facilita suas campanhas.

Quanto às motivações do presente desacordo entre PT e PP, caso de fato se consume, é provável que ambas as que você levantou (a objetividade do desgaste do tempo e as subjetividades estratégicas dos atores) tenham seu papel. Qual a decisiva, precisamos aguardar um pouco mais para saber.

O grupo oposicionista liderado pelo ex-prefeito de Salvador, ACM Neto tem acompanhado de camarote a confusão governista. A aproximação entre João Leão e ACM Neto é vista como natural, dada a origem das duas personagens políticas no seio carlista. Membros do PP e do União Brasil chegam a considerar uma chapa Neto-Leão como “imbatível”. É razoável considerar esta chapa desta forma?

Neto está de camarote, ao menos em público, primeiro porque qualquer desfecho dessa novela governista lhe favorecerá, em comparação ao que seria um cenário em que enfrentaria Wagner ou Otto e Rui e mais Lula, disputando a eleição. Com Rui e Wagner fora das urnas, Neto já está no lucro. A adesão de Leão será um ‘plus’, mas mesmo que ela não ocorra, não será de todo mau para Neto ter o PP governando durante os 8 meses da campanha. Em segundo lugar, Neto joga parado apenas nos bastidores, porque não tem outra coisa a fazer, já que a decisão não lhe compete e sim ao vice-governador. A bola decisiva para essa provável aliança sua com o PP não está com ele e sim com Leão.

Quanto à chapa Neto/Leão ser natural por razões ideológicas não creio que ideologia seja um fator relevante. Seguramente não tem sido, nem no campo da direita nem no da esquerda e não apenas na Bahia. E no caso de Leão, eu não saberia sequer defini-lo sob esse ponto de vista. Quanto a ser uma chapa imbatível não vejo por que seria. É verdade que Neto, por ora, é favorito mas uma possível disputa ao Senado entre Otto Alencar e João Leão tem tudo pra ser muito renhida e talvez polarize mais do que a de governador, ainda que não se trate de uma polarização ideológica.

Foi confirmada pelo PT a pré-candidatura ao governo do secretário da Educação Jerônimo Rodrigues na sexta-feira. Em comentário feito também na sexta-feira, o ex-deputado federal Domingos Leonelli (PSB) criticou a escolha de Rui Costa e disse que ele “tirou um nome do colete” ao escolher Rodrigues, segundo ele, estimado no meio político, mas desconhecido. Disse que Rui repetiu o que fez Wagner em 2014, quando o escolhido foi Rui. Leonelli diz que “a história pode não se repetir “. É uma análise correta?

Concordo, em parte. Parece, pelo que se diz, que Jerônimo Rodrigues – o menos conhecido dos três petistas que foram cogitados para ocupar o lugar na chapa que supostamente seria ocupado por Wagner ou, como pareceu em seguida, por Otto – é o nome preferido pelo governador que pode, inclusive, ter posto as coisas em termos impositivos, como condição para desistir do Senado. Mas é preciso considerar outra coisa. Tendo a ver que, para o PT baiano, essa é a melhor opção, dentre as que restaram depois de toda essa confusão. A probabilidade de Jerônimo não vencer a eleição é muito grande por mais que o PT arregace as mangas na campanha, como creio que ocorrerá, por causa de Lula principalmente. Mas essa expectativa de derrota valeria também caso a escolha recaísse em Luiz Caetano ou em Moema Gramacho.

Jerônimo pode ser uma saída mais honrosa para o partido que, com ele, mesmo perdendo, pode perder de pé e acenando ao futuro. A depender da postura que adote na campanha (se for além da atitude de porta-voz de Lula e mostre ideias sobre a Bahia), ele pode neutralizar, ao menos em parte, o argumento de Neto, que ressalta sempre sua juventude e compromisso contemporâneo, contra o que seria desgaste e anacronismo do grupo do PT. Tanto Caetano como Moema ajudariam esse discurso pela mudança . Com Jerônimo, há alguma chance de uma virtual derrota ser reduzida a uma não-vitória e em vez de desastre, haver semeadura.

Quanto a se repetir com Rui/Jerônimo o que ocorreu em 2014 com Wagner/Rui, o aspecto mais difícil de ocorrer é aquele êxito eleitoral. Mas impossível não é. Se ocorrer, a façanha, dentro das atuais circunstâncias ( ausência da máquina federal a favor e presença de um adversário muito forte) será bem maior que a de 2014 e sua autoria será repartida, principalmente, entre Rui e Lula. Wagner terá colaborado para esse virtual recomeço com o desmanche arriscadíssimo que operou na sua própria candidatura e na pretensão do governador de se candidatar ao Senado.

Os grupos governista e oposicionista na Bahia trabalham com teses distintas para as eleições. Os primeiros creem na influência de Lula; os segundos numa estratégia de desvinculação do pleito nacional. É realista afirmar que a eleição para presidente não influirá na disputa pelo governo baiano e pela vaga no Senado?

Especialmente no caso da eleição ao governo estadual seria um fato inédito na Bahia, lugar onde a disputa nacional sempre teve grande influência. Nem ACM, o avô, logrou essa estadualização radical. Sempre o fator nacional contou muito e penso que dessa vez não será diferente. Mas isso não quer dizer que ACM Neto será vencido pela polarização nacional apenas porque está sem palanque presidencial enquanto seus adversários têm Lula. É preciso considerar duas coisas.

Primeiro, o fator Lula pode influir muito e, contudo, isso não ser suficiente para que Jerônimo, hoje quase anônimo, derrote o ex-prefeito de Salvador. O fator Lula pode ser decisivo para tornar bem disputada uma eleição que imprudentes podem considerar uma barbada e também para que o PT possa fazer uma oposição consistente na Bahia durante o próximo quatriênio e com isso tenha uma expectativa de retornar ao governo em 2026. Segundo, que ACM Neto não é um amador. Se realmente ficar sem candidato nacional (e isso depende de Lula de fato conquistar o centro e voltar a subir nas pesquisas) ele não tende a ficar resmungando no “nem, nem”. Creio que tentará neutralizar o fator Lula, flertando com ele, como aliás, já tem feito, segundo más línguas afiadas.

Davi Lemos

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