A taxa de investimento no Brasil saltou de 16,6% para 19,2% no último ano, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). É o melhor resultado do indicador desde 2014 e está acima da média dos últimos dez anos, que foi de 17,7%. O desempenho é animador, mas ainda está longe do ideal. Levantamento do portal Brasil 61 junto ao Fundo Monetário Internacional (FMI) aponta que 65% dos países continuam à frente do Brasil quando o assunto é taxa de investimento proporcional ao PIB.
Segundo o IBGE, a formação bruta de capital fixo, ou seja, os investimentos que as empresas fazem para ampliar a capacidade de produção, avançou 17,2% em 2021. Destaque para os investimentos em máquinas e equipamentos (um dos componentes do indicador), que cresceram 23,6%.
O professor Adriano Paranaíba, economista e diretor do Mises Academy, diz que o resultado é promissor. “Para a gente gerar emprego, renda e crescimento de um país é o indicador mais importante. A compra de máquinas e equipamentos significa que o empresário está vendo que vai ter uma retomada do consumo de bens, então eu tenho que fabricar mais produtos. Ao fabricar mais produtos, tenho que contratar mais gente, até mesmo para começar a fábrica, e aí você tem essa onda de crescimento saudável”, explica.
Margarida Gutierrez, economista e professora do Coppead da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), explica que ninguém investe em máquinas e equipamentos para tê-los parados nas fábricas. Ou seja, se houve crescimento nesse indicador é porque a perspectiva em relação ao ambiente de negócios para os próximos anos é otimista.
“Para o investimento acontecer, ele depende de expectativas favoráveis, muito mais do que da taxa de juros. Se essa taxa de investimento cresceu tanto, se a compra de máquinas e equipamentos, construções e novas tecnologias cresceu 17% em 2021, isso é um sinal de expectativas altamente favoráveis. Nenhuma empresa aumenta uma instalação, seu parque fabril, se não tiver expectativas de aumento de vendas”, afirma.
Pierre de Souza, professor e consultor da Fundação Getulio Vargas (FGV), aponta que o crescimento da taxa de investimento é animador, mas que é preciso esperar um pouco para avaliar se a alta será sustentável nos próximos anos.
“Temos que ter em mente também que é um número que ainda está próximo do que era entre 2012 e 2014, ou seja, não é que a gente esteja acima do que estava naquela fase. Olhando uma série histórica um pouco mais longa, ainda não é tão animador assim. É um número bom, um patamar melhor. A gente ainda tem bastante espaço pra crescer e, talvez, a gente consiga ver nos próximos meses se 2022 segue nessa linha de crescimento”, avalia.
Tal cautela se justifica, para Pierre, porque os aportes em construção também aumentaram (12,8%), mas não na mesma proporção do que o componente máquinas e equipamentos, por exemplo.
“Quando é que a gente vai se empolgar com o número? Quando a construção civil também seguir nessa toada. Porque se a construção civil aumentou o investimento em ativos fixos, a gente tem realmente uma visão de longo prazo no sentido de ‘oh, tem um ativo físico que está sendo construído e isso não vai ser uma coisa de curto prazo’. Tem um crescimento importante em máquinas e equipamentos, mas construção civil ainda não é tão significativo. É um dado que a gente vai ter que acompanhar, porque seria mais sustentável, ou seja, o investimento no Brasil nessas duas vertentes subindo junto”, analisa.
Causas
Os economistas que o Brasil 61 conversou são unânimes ao apontar que o crescimento da taxa de investimento tem, entre as causas, a melhoria do ambiente de negócios. A aprovação dos marcos do saneamento básico, do mercado de câmbio e das ferrovias, da nova lei do gás e da lei de liberdade econômica, estão entre as iniciativas que colaboram para atrair investimentos, aponta Pierre.
“Tudo isso que tende a gerar um ambiente mais amigável ao investidor tem relação direta com quanto vai ser investido aqui. Quando a gente olha reformas ainda mais específicas para investimento, ou seja, [marco das] ferrovias, eu estou atraindo investidores, dando a possibilidade para ele investir em ferrovias para ter um retorno no futuro, estou criando o ambiente propício para o investimento”, diz.
Paranaíba diz que o marco do saneamento básico já surte efeitos na economia. “A gente já está vendo muitos investimentos.Tivemos licitações em cidades, em regiões metropolitanas importantes do Brasil, leilões de valores de investimento bem alto”, cita.
Além disso, ele explica que o formato das licitações de concessões de serviços à iniciativa privada está melhorando, o que influencia o impacto dos investimentos. “O leilão do 5G está sendo um divisor de águas de como o Brasil faz leilão. Porque, até então, o investidor para explorar um serviço público dava um dinheiro para o governo [em outorgas]. No do 5G ganha o leilão quem falar que vai investir mais em infraestrutura. Isso acelera esse processo e atrai investimento inteligente, que realmente vai trazer mudança para a sociedade”, avalia.
Abaixo do potencial
Apesar de atingir seu melhor resultado desde 2014, quando a taxa de investimento foi de 19,9%, o Brasil vê 127 países melhor colocados quando o assunto é investimento. O levantamento do World Economic Outlook (WEO), do FMI, lista 196 países. Isso significa que quase dois terços dos países têm melhor desempenho nesse indicador do que o Brasil.
Quando a comparação é com as 20 maiores economias do mundo, entre as quais o Brasil está, o país só tem taxa de investimento maior do que o Reino Unido. Empata com a Itália, mas perde para outros 17 países. Confira o levantamento do Brasil 61 abaixo.
Em relação ao grupo dos BRICS, formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, a taxa de investimento nacional só está acima da dos sul-africanos.
Taxa de investimento/PIB – BRICS
- China – 42,9%
- Índia – 29,7%
- Rússia – 23,4%
- Brasil – 19,2%
- África do Sul – 13,5%
O investimento no Brasil também está abaixo da média de investimento nos países que fazem parte da América Latina e Caribe, que é de 19,4%. Já em relação às economias emergentes ou em desenvolvimento, o desempenho é ainda menor. Esses países têm taxa de investimento média de 33,1%, segundo o FMI.
Adriano Paranaíba afirma que o Brasil ainda está “muito longe do ideal”. Ele explica que outros rankings, como o de liberdade econômica e desenvolvimento econômico, também retratam essa situação. “Mesmo com essa melhoria a gente subiu poucas posições e, muitas vezes, a gente subiu posições em alguns indicadores porque países que estavam na nossa frente caíram nesse período de pandemia. Mas isso é só uma prova de como nós estávamos realmente atrasados e que um crescimento de 17% ainda fez a gente ficar lá na lanterninha”, destaca.
Pierre diz que o crescimento do investimento no Brasil é motivo para comemoração, mas não pode esconder que o país está aquém de seu potencial. “Comparando com outros países a taxa de investimentos no Brasil ainda é menor a economias similares à nossa. E esse é um ponto que realmente preocupa, porque uma coisa é estar melhorando, nós contra nós mesmos. Agora, a gente tem que ver a gente comparado ao resto do mundo”, diz.
Os economistas apontam que a relação entre investimento e PIB é direta. Ou seja, se os investimentos aumentam, o país tende a crescer economicamente. O contrário também se aplica, via de regra.
“Dificilmente você vai encontrar um país que teve um crescimento de PIB sustentável sem ter tido um crescimento de investimento também sustentável. O país tem que investir, criar os ativos que, no longo prazo, vão gerar economia. Tem discussões sobre qual é o vetor de investimento: se público ou privado, aqui entra numa outra seara, mas o ponto importante, é: como é que tu vai criar um PIB sustentável? Pelo investimento”, afirma Pierre.
“Países que abriram sua economia mais do que o Brasil para investimentos e permitiram que esses investimentos, de fato, acontecessem deram um salto de crescimento econômico, como Austrália, Coréia do Sul, o próprio Chile, muito antigamente. Esses países conseguiram não só um crescimento econômico para dizer que o PIB cresceu, mas melhoria da qualidade de vida das pessoas”.
Adriano Paranaíba, economista.
Por isso, a tendência é que se a taxa de investimento no Brasil cresceu em 2021 e continuar avançando isso vai se refletir no PIB brasileiro dos próximos anos. “Teve mais capital fixo investido. Espera-se que esse capital fixo gere retorno, e esse retorno vai se refletir no PIB de 2022, 2023 e 2024”, diz Pierre.
Paranaíba explica que os efeitos das reformas estruturais já feitas, como a previdenciária, trabalhista, e dos marcos legais não ocorrem da noite para o dia. “Infelizmente, com um discurso eleitoreiro, muita gente pode falar assim ‘oh, está vendo, a gente fez um monte de reforma e não mudou’. Não mudou porque ainda não deu tempo delas de fato acontecerem, de haver a maturação dos investimentos e esses investimentos lograrem sucesso para atrair mais investimentos”, analisa.
Os especialistas também afirmam que a reforma tributária é o próximo passo significativo que o Brasil tem que dar para que os investidores continuem chegando. “Essa é a mãe das reformas que a gente está precisando fazer pra realmente ter investimento. O sistema tributário brasileiro é um manicômio tributário. Um investidor para vir ao Brasil tem que, primeiro, contratar um escritório de advocacia tributarista para entender o sistema. O custo de se pagar o imposto no Brasil pode ser até maior do que o valor do próprio imposto. Então, é isso que afugenta mais investimentos ainda no Brasil”, finaliza.
Fonte: Brasil 61