Foi em São Francisco, na Califórnia, no que chama de “costas cheirosas” dos Estados Unidos, que o sociólogo e empresário José César Martins pôde constatar a extensão do trauma de parte da sociedade americana com o resultado da disputa presidencial de 2016. “Eu vi a cidade chorando no dia seguinte à eleição do (republicano Donald) Trump”, recordou ele, em entrevista ao Estadão.
Fundador do movimento Derrubando Muros, Martins disse considerar que a surpresa com o resultado não fazia sentido. Isso porque, segundo ele, a cisão e a desigualdade, então crescentes no país onde vivia e que levaram à derrota da democrata Hillary Clinton, já eram visíveis. “O modelo de renovação da economia americana fez sucumbir o modelo que empregava o interior dos Estados Unidos”, observou o sociólogo, que trabalhou no Banco Mundial e depois virou empresário. Abriu quatro empresas – a última, a Go Digital, foi vendida em 2012 para uma corporação americana.
Martins comparou a situação dos Estados Unidos à do Brasil. “Quando Jair Bolsonaro foi eleito, muita gente se disse surpreendido. Mas nem todo mundo estava.” Foi por isso que, no começo do atual governo, já de volta ao Brasil, Martins e um grupo de acadêmicos e empresários iniciaram discussões sobre uma saída para o País. Eles não a viam ser formulada “pelo pessoal do centro” e debatiam propostas, sem compromissos partidários. Foram dois anos e 14 reuniões até com nomes cotados para disputar o Planalto, como a empresária Luiza Trajano.
Martins advertiu que Bolsonaro, agora com apoio do Centrão, não deve ser subestimado. Ele criticou ainda o ex-presidente petista Luiz Inácio Lula da Silva por não detalhar propostas – um defeito que vê como comum na política brasileira. Reconheceu também que a situação de bipolaridade é “tudo que a gente não queria”, mas mostrou entusiasmo com o recente processo de “afunilamento” de candidaturas da chamada terceira via, acelerado nos últimos dias.
Estadão