Partido de Bolsonaro ignora inspeção de urnas, enquanto presidente cobra auditoria

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Foto divulgação

Apesar de estar disponível para inspeção desde 4 de outubro na sede do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), o chamado código-fonte da urna eletrônica não foi alvo até o momento de análise do PL, partido do presidente Jair Bolsonaro.

O código-fonte é um conjunto de linhas de programação que dão as instruções de funcionamento para a urna eletrônica, que é alvo de uma série de mentiras e teorias conspiratórias do presidente da República, candidato à reeleição em outubro.

A realização da inspeção não é obrigatória, mas é uma das principais fases de auditoria do processo eleitoral.

Em maio, durante sua live semanal, o presidente disse que o PL contrataria uma empresa para fazer uma auditoria privada das eleições deste ano. O partido ainda não confirmou se contratará ou não uma empresa.

O anúncio sobre a auditoria ocorre no momento em que Bolsonaro amplia os questionamentos ao processo eleitoral e faz insinuações golpistas. Em tom de ameaça, ele disse que os resultados dessa futura análise podem complicar o TSE se a empresa constatar que é “impossível auditar o processo”.

Bolsonaro afirmou que a auditoria não seria feita após as eleições, mas que a empresa começaria a trabalhar assim que contratada e solicitaria ao TSE uma “quantidade grande de informações”.

Até agora, porém, a única visita do PL ao TSE para acompanhamento dos sistemas ocorreu em 9 de dezembro, quando três representantes do partido estiveram no tribunal por cerca de três horas.

Eles assistiram a apresentações sobre o processo eleitoral e os principais sistemas utilizados, bem como sobre o funcionamento da urna e seus dispositivos de segurança. Também tiveram dúvidas esclarecidas. Na data, não houve nenhuma análise do código.

A visita foi agendada por meio de ofício do presidente do PL, Valdemar Costa Neto, datado de 23 de novembro —uma semana antes do evento oficial de filiação de Bolsonaro ao partido.

Ele respondia a convite do TSE do início de outubro, também remetido aos demais partidos e entidades fiscalizadoras, em que o então presidente da corte, Luís Roberto Barroso, comunicava que os códigos estavam disponíveis para inspeção. O ministro recomendava ainda que a fiscalização fosse realizada por “profissionais da área de tecnologia da informação”.

Representaram o PL na visita Luiz Henrique Sampaio Guimarães, Rui Fernandes Ribeiro Júnior e Glaydson Gomes Guerra. Os dois últimos são assessores parlamentares na Assembleia Legislativa de São Paulo, atuando respectivamente junto à liderança do PL na Casa e a uma deputada do partido. Já Sampaio Guimarães consta como segundo tesoureiro do PL na Executiva Nacional.

A Folha conseguiu entrar em contato apenas com Ribeiro Júnior, que confirmou que não houve análise dos códigos em sua visita. Ele relata que assistiu a apresentações básicas sobre o processo eleitoral e diz que a visita era uma primeira etapa.

Gomes Guerra foi procurado no gabinete em que trabalha, mas não retornou às ligações, já Sampaio foi procurado por meio da assessoria de comunicação do partido.

O TSE afirmou que posteriormente a essa visita o PL não retornou ao tribunal para inspecionar os códigos-fonte nem fez menção de retorno.

Fora o PL, o PV foi o único partido a comparecer, mas também não inspecionou o código-fonte.

Além dos partidos, há um rol de entidades e órgãos que podem atuar na fiscalização, como OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Polícia Federal e Forças Armadas. Até o momento, compareceram ao TSE para inspecionar os códigos-fonte CGU (Controladoria-Geral da União), MPF (Ministério Público Federal) e o Senado, além da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. A análise pode ser feita até agosto.

A legislação atual prevê outras etapas de auditoria antes, durante e após o pleito. Entre elas está o Teste Público de Segurança, em que hackers e especialistas tentam encontrar vulnerabilidades para posterior correção. Peritos da PF examinaram os códigos durante o evento. O PL não participou.

Partidos e entidades podem desenvolver programas próprios de verificação dos sistemas, mas há prazo. Os programas devem ser apresentados até 4 de julho para homologação da Justiça Eleitoral.

Além de ser permitida a contratação de terceiros para as diferentes fases de auditoria, na Lei das Eleições, é mencionada expressamente a possibilidade de contratação de empresas de auditoria pelos partidos, que deverão ser credenciadas junto à Justiça Eleitoral.

Em resolução específica estão elencados quais arquivos e programas podem ser solicitados e em que momento. O prazo para pedir os arquivos da votação começa nos dias seguintes ao primeiro e segundo turnos, indo até 10 de janeiro.

Após as eleições de 2014, o PSDB solicitou a realização de auditoria especial que passou por aprovação do TSE. O partido não identificou nenhuma fraude, mas fez um relatório final com várias críticas ao formato de auditoria do tribunal.

Nas regras atuais, está prevista a possibilidade de solicitação de verificações extraordinárias dos sistemas eleitorais após as eleições, desde que sejam “relatados fatos e apresentados indícios e circunstâncias que a justifiquem”. Caso contrário, podem ser indeferidas liminarmente.

Essa solicitação pode ser feita até 5 de janeiro e deve ser acompanhada de plano de trabalho. As regras preveem os sistemas que podem ser averiguados.

A princípio, o discurso de Bolsonaro sinaliza que não é essa verificação que ele pretende empreender, já que afirmou que a auditoria não seria feita após as eleições. No entanto, a exemplo do que fez o PSDB, o presidente pode vir a apontar lacunas entre as verificações previstas e aquelas que pretenderia realizar, tornando o cenário incerto.

A fiscalização de partidos também é prevista tanto na cerimônia de assinatura digital, compilação e lacração dos sistemas eleitorais, em agosto, assim como na cerimônia de lacração das urnas após instalação dos sistemas.

No dia da eleição também podem fiscalizar o teste de integridade, em que voluntários votam em papel, e os mesmos votos são digitados em urnas sorteadas. Tudo é filmado e, ao final, é verificado se os resultados batem.

A Folha perguntou ao PL por que o partido não inspecionou o código-fonte, mas não houve resposta até a publicação do texto. Questionou também se o partido contrataria uma empresa para auditoria do processo eleitoral e, em caso positivo, de quais etapas de auditoria previstas na legislação ela participaria.

Segundo a assessoria, o PL ainda não tem nada oficial sobre o assunto e tampouco há informação sobre até quando se pretende definir a questão. “Isso, certamente, já deve estar sendo tratado, mas não temos nada oficial até o momento.”

Renata Galf, Folhapress

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