Foto: Bruno Spada/Câmara dos Deputados
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), incluiu como pauta única de votação desta terça-feira (30) o projeto de lei do marco temporal, em meio a tentativas de integrantes do governo Lula (PT) de adiar a apreciação do texto.
A tendência é que a proposta seja aprovada, o que representaria mais uma derrota para o governo na área ambiental. A urgência ao projeto do marco foi aprovada na semana passada por 324 votos contra 131, de 257 necessários.
“[Sobre o] Marco temporal, estamos trabalhando para não ir para a pauta. Se for, vamos encaminhar o voto não”, afirmou o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE).
Integrantes do governo já sinalizavam que haveria dificuldade de adiar a votação. Nos bastidores, já admitem a derrota no texto na Câmara, até por receio de atrapalharem a votação da medida provisória que muda a Esplanada dos Ministérios, prioritária para o Palácio do Planalto.
“Nós estamos dialogando com ele [o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL)], com o Supremo e com a Casa para ver se a gente constrói um acordo [para] que isso não entrasse na pauta. Isso ainda está em pendência”, disse.
“O [Jorge] Messias [Advogado Geral da União] está trabalhando, o ideal é não votarmos a matéria. A matéria é sensível, divide a Câmara, é o primeiro item da pauta. Vamos buscar um acordo para buscar uma solução negociada”, disse Guimarães.
A pauta única foi divulgada no final da tarde. O projeto é considerado prioritário pela FPA (Frente Parlamentar da Agropecuária), que reúne 300 deputados e é uma das maiores forças da Câmara.
Apesar de ter mencionado a AGU (Advocacia Geral da União), o ideal para uma ala do governo é construir um acordo junto a Lira sem precisar acionar a Justiça.
Na reunião de líderes, o presidente da Câmara disse que retiraria o marco da pauta caso o STF desmarcasse o julgamento da próxima semana. Integrantes do próprio Ministério dos Povos Indígenas conversaram com o ministro Alexandre Padilha (Secretaria de Relações Institucionais) dizendo que não interessa à pasta que o STF retire o caso da pauta. Por isso, pediram cautela à articulação política.
Nesta terça, deputados da Frente Parlamentar da Agropecuária refutaram a ideia de que o texto tenha chance de não ser votado nesta terça.
Parlamentares da base do governo apresentaram propostas de alteração do texto ao relator, Arthur Maia, mas o relatório deverá permanecer como está.
“O ônus hoje é do governo, que precisa votar a MP da organização dos ministérios em seguida. Então quanto mais obstruirem [a votação], mais difícil fica a votação da MP”, disse o presidente da FPA, Pedro Lupion.
Ainda na tarde desta terça, a deputada Célia Xakriabá (Psol-MG) e a ministra Sonia Guajajara (Povos Indígenas) reuniram parlamentares em apoio à retirada do projeto da pauta da Câmara.
“Não podemos dar ainda o jogo como acabado”, disse Gujajara. “[Se este projeto foi aprovado no Congresso] vai paralisar todo e qualquer processo demarcatório do Brasil”, completou.
Os parlamentares também criticaram o cancelamento de um seminário que aconteceria na Câmara, também nesta terça, e que contaria com a presença de lideranças indígenas. Segundo Xakriabá, a decisão da Casa teve a intenção de enfraquecer a mobilização contra a proposta do marco temporal.
O projeto de lei do marco temporal avançou na Câmara como uma estratégia do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), para se antecipar ao julgamento do STF (Supremo Tribunal Federal) sobre este tema. A corte marcou para junho o julgamento sobre o tema e pode rejeitar a criação do marco temporal.
O texto da proposta institui a tese segundo a qual as terras indígenas devem se restringir à área ocupada pelos povos na data da promulgação da Constituição Federal de 1988. Essa é a ideia defendida pelos deputados da bancada ruralista.
Os indígenas rejeitam esse argumento e afirmam que, pela Constituição, lhes é de direito seus territórios originais.
O projeto de lei também cria dispositivos que flexibilizam a exploração de recursos naturais e a realização de empreendimentos dentro de terras indígenas.
Ambientalistas e o movimento indígena criticam o projeto e veem brechas para permitir garimpo, atividade agropecuária, abertura de rodovias, linhas de transmissão de energia ou instalação de hidrelétricas, além de contratos com a iniciativa privada e não indígena para empreendimentos.
A discussão sobre a votação do marco temporal ocorre no mesmo dia em que o governo tenta aprovar a medida provisória que reestrutura Esplanada dos Ministérios.
Líderes de partidos do centrão resistem a aprovar a MP e ameaçam o governo com o risco de ela perder a validade. Se isso ocorresse, a estrutura do governo voltaria a ser a do ministério anterior, de Jair Bolsonaro (PL), o que representaria uma grande derrota a Lula.
Por isso, o principal objetivo do governo no dia é aprovar a medida provisória.
“A prioridade para o governo é votar a MP 1154, o relatório que saiu da comissão mista, já conversamos aqui hoje, a opinião é que todos vamos votar favoráveis ao relatório que foi aprovado na comissão mista, porque isso é central para o governo aprovar essa medida provisória, para ser votada amanhã no Senado”, afirmou o líder do governo na Câmara.
O relatório da medida provisória retira do Ministério do Meio Ambiente o CAR (Cadastro Ambiental Rural) e a ANA (Agência Nacional de Águas), além de uma série de sistemas, o que foi considerado a desidratação de funções importantes do ministério. Da mesma forma, o reconhecimento e a demarcação de terras indígenas, hoje no Ministério dos Povos Indígenas, vão para a pasta da Justiça.
Segundo Guimarães, o governo vai analisar a apresentação de destaques, mas a prioridade é conseguir aprovar a proposta. Nos bastidores, o governo sabe que se tentar mexer no relatório, pode sofrer uma derrota ainda maior no Congresso, por isso, tentará ao menos manter o texto aprovado na semana passada.
Julia Chaib/Victoria Azevedo/João Gabriel/Folhapress
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