O ministro da Educação, Milton Ribeiro, disse que a volta às aulas presenciais e o aumento da desigualdade educacional no país com a pandemia não são responsabilidades de sua pasta, mas um "problema do Brasil".
As declarações foram feitas em entrevista ao jornal O Estado de São Paulo, publicada nesta quinta (24). Ele ainda afirmou que pretende mudar a educação sexual nas escolas brasileiras e atribuiu a homossexualidade a "famílias desajustadas".
Para especialistas e entidades educacionais, as declarações do ministro demonstram desconhecimento das responsabilidades do MEC e destacam que a fala de Ribeiro é preconceituosa, ofensiva e ilegal.
Para ele, o ministério não pode interferir na condução das políticas educacionais adotadas durante a pandemia. "A lei é clara. Quem tem jurisdição sobre escolas é estado e município. Não temos esse tipo de interferência", disse na entrevista.
Sobre o aumento das desigualdades educacionais com a suspensão das aulas presenciais, Ribeiro afirmou se tratar de um problema que "só foi evidenciado pela pandemia". "É estado e município que têm de cuidar disso aí. Nós não temos recurso para atender. Esse não é um problema do MEC, é um problema do Brasil".
"Não tem como, vai fazer o quê? É a iniciativa de cada um, de cada escola. Não foi um problema criado por nós. A sociedade brasileira é desigual e não é agora que a gente, por meio do MEC, vai conseguir deixar todos iguais", continuou.
Gregório Grisa, especialista em políticas educacionais pelo IFRS, destacou que a Constituição define como responsabilidade da União a "função redistributiva e supletiva, de forma a garantir equalização de oportunidades educacionais e padrão mínimo de qualidade do ensino mediante assistência técnica e financeira" aos estados e municípios.
"O ministro está equivocado sobre as responsabilidades do ministério que comanda. Ele fez quase um anúncio de improbidade administrativa ao se eximir de seu papel. Estamos diante da maior crise educacional da nossa geração e o MEC até o momento não anunciou nenhuma ação", afirmou Grisa.
Para a UNE (União Nacional dos Estudantes), é "inaceitável o ministro se eximir de suas responsabilidades". A entidade disse que, "enquanto estudantes sentem dificuldades de permanecer nos estudos", o MEC assiste em paralisia à situação.
Questionado sobre as ações para melhorar os resultados da educação básica no país, o ministro disse que quer uma revisão dos conteúdos ensinados nas escolas. "Fica gastando tempo assuntos que são laterais. As crianças têm de aprender outras coisas".
Ele disse ainda que quer uma revisão na educação sexual para que não haja "incentivo a discussões de gênero". "Quando o menino tiver 17,18 anos, ele vai ter condição de optar. E não é normal. A biologia diz que não é normal a questão de gênero. A opção que você tem como adulto de ser um homossexual, eu respeito, não concordo", afirmou.
Ribeiro ainda usou o termo "homossexualismo", que deixou de ser usado pela OMS (Organização Mundial da Saúde) há 30 anos por não se tratar de uma doença. "Acho que o adolescente que muitas vezes opta por andar no caminho do homossexualismo tem um contexto familiar muito próximo, basta fazer uma pesquisa. São famílias desajustadas, algumas. Falta atenção do pai, falta atenção da mãe".
"Vejo menino de 12, 13 anos optando por ser gay, nunca esteve com uma mulher de fato, com um homem de fato e caminhar por aí. São questões de valores e princípios", continuou o ministro, que é pastor da Igreja Presbiteriana.
O GaDvs (Grupo de Advogados pela Diversidade Sexual) informou que entrará com queixa criminal de crime de racismo homotransfóbico e ingressará com ação civil por dano moral coletivo.
"O ministro simplesmente ofendeu a honra de toda comunidade homossexual e trans na sua fala é isso é ilegal, civil e criminalmente, já que a honra é um direito fundamental. Embora um governo ultra conservador tenha agenda nesse sentido, não pode usar a estrutura do Estado para ofender pessoas, disseminar mentiras e ignorar a obrigação constitucional de combater todas as formas de discriminação", disse Paulo Iotti, diretor-presidente do grupo e doutor em direito constitucional.
Folha Press